Naquele dia, saí com meus discípulos e fui para o outro lado da torrente do Cedron. Naquele lugar havia um jardim muito belo, onde nos alojamos. Para meus apóstolos, parecia um dia como outro qualquer, mas o que eles não imaginavam é que mais uma etapa de minha missão de paz se iniciaria.
Judas, por uma razão que todos desconheciam, exceto Eu, não estava conosco naquele momento. Ele conhecia bem aquele lugar, até porque, não era a primeira vez que nós nos reunimos ali. De repente, o motivo de sua ausência foi revelado: ele apareceu onde nós estávamos e não veio só, junto com ele, estavam um destacamento de soldados e alguns guardas dos sumos sacerdotes e fariseus. Em suas mãos, lanternas, tochas e armas poderosas, como se estivessem à procura de um poderoso exército de criminosos. Então Eu, muito consciente de tudo o que ia acontecer, saí ao encontro deles e perguntei: “A quem procurais?”. Eles responderam: “A Jesus, o Nazareno” (Jo 18,1-4).
Dei, porém, uma resposta que deixaria todos surpresos. Disse: “Sou eu” (Jo 18,8). Eles, insatisfeitos e desconfiados, insistiram: “Quem de vocês é Jesus?” Eu continuei com minha decidida resposta: “Já vos disse que sou eu. Se é a mim que procurais, então deixai que estes se retirem”. Eu não queria entregar à morte nenhum de meus discípulos. Na verdade, Eu queria que eles livremente se entregassem por amor (cf. Jo 18,9).
Pedro, como era previsível, teve um ato impulsivo. Trazia uma espada na cintura, puxou-a e com ela feriu um dos servos do sumo sacerdote. O golpe foi tão certeiro que cortou a sua orelha direita (cf. Jo 18,11). Então o censurei com vigor, dizendo: “Guarda a tua espada na bainha Pedro. Não irei eu beber o cálice que o Pai me deu?” (Jo 18,11).
Em seguida, fui preso e levado por eles, dando início a uma avalanche de interrogatórios e torturas. Conduziram-me primeiro a Anás, que era o sogro de Caifás, o sumo sacerdote naquele ano. Ali, começaram a intuir que, naquela circunstância, o ideal era que um só homem morresse no lugar de todos, ou seja, Eu seria o alvo (cf. Jo 18,14). Minha solidão foi imensa. Até Pedro teve medo e fugiu após ter-me negado diante do primeiro interrogatório que sofreu (cf. Jo 18,17).
Interrogatório de ódio
Mesmo com uma avalanche de interrogatórios, Eu me mostrava, como sempre, calmo e sereno em minhas respostas. Dizia que havia falado às claras para todos os que estavam dispostos a me ouvir. Que havia ensinado na sinagoga, no Templo, onde todos os judeus se reuniam. Nada havia falado às escondidas e que, por isso, não entendia o motivo do interrogatório (cf Jo 18,20-21). Meu senso de verdade foi tão decidido, que desafiava os que me questionavam: “Perguntem aos que me ouviram; eles sabem o que eu disse” (Jo 18,21).
As reações, porém, eram sempre de mais agressão, tanto que, ao ouvir uma de minhas respostas, um dos guardas que ali estava deu-me uma bofetada, dizendo: “É assim que respondes ao Sumo Sacerdote?” (Jo 18,22) Às vezes, uma pergunta bem feita vale muito mais do que uma dúzia de respostas. Diante da agressão, fiz a ele uma simples e oportuna pergunta: “Se respondi mal, me mostra em quê; mas, se falei bem, por que me bates?” (Jo 18,23). Minha solidão foi imensa, pois sentia-me abandonado por meus discípulos, mesmo os mais próximos.
O meu Reino não é deste mundo
O interrogatório injusto continuou, entre um bofetão e outro, entre uma cusparada e outra, perguntas me eram feitas e Eu as respondia, assim, revelando facetas cada vez mais claras e reluzentes de meu Reino. “Eu sou rei. Eu nasci e vim ao mundo para isto: para dar testemunho da verdade. Todo aquele que é da verdade escuta a minha voz” (Jo 18,37). Pilatos, apesar de todas as acusações feitas a mim, não encontrava culpa alguma. Tentava, inclusive, convencer nosso povo a soltar-me, usando como argumento o costume de liberar um criminoso, por ocasião da páscoa judaica (cf. Jo 18,39). Meu nome foi sugerido para ser solto no lugar de um grande criminoso, Barrabás. O povo, porém, não satisfeito com a proposta de Pilatos, começou a gritar ainda mais forte: “Não, não e não, preferimos que condene Jesus e que solte o criminoso Barrabás!” (Jo 18,40). Então, Pilatos mandou me flagelarem ainda mais. Os soldados teceram uma coroa de espinhos e colocaram-na sobre minha cabeça e, para aumentar ainda mais o deboche, colocaram sobre meu corpo um manto cor de púrpura e, com risadas, diziam entre um soco e outro: “Salve Rei dos judeus!” (Jo 19,1-3).
Crucifica-o, crucifica-o!!!
Após a avalanche de torturas e sangue, o líder do povo, como que sentindo algum pesar ou talvez com esperança de que os judeus estivessem satisfeitos, disse: “Eu o entrego a vocês porque, pessoalmente, não encontro nele nenhum crime”. Então, colocaram um manto em minhas costas, que por sinal rapidamente ficou todo ensanguentado. Em seguida, introduziram uma coroa de espinhos na cabeça (cf. Jo 19,4-5). Os líderes dos judeus, ao contemplarem meu rosto, cheios de um ódio que é até difícil de ser descrito, gritaram ainda mais forte do que antes: “Nós temos uma lei e segundo essa lei, ele deve morrer. Crucifica-o, Crucifica-o!” (Jo 19,6).
Pilatos, envolvido pela emoção do momento, fez ainda uma última tentativa de diálogo comigo. Aproximou-se e perguntou: “De onde és? Não sabes que tenho poder de te condenar ou de te deixar livre?” (Jo 19,10). Respondi olhando nos seus olhos: “Não terias poder nenhum sobre mim, se não tivesse sido dado do céu. Aqueles, porém, que me entregaram a ti, tem culpa maior” (Jo 19,11). Pilatos até queria me soltar, mas o povo insistia que, se isso fosse feito, ele não seria amigo do Imperador César (Cf. Jo 19,12). Era impressionante como, mesmo um pagão, conseguiu ser mais justo e sensível aos meus sofrimentos do que a multidão do povo eleito que gritava, cheia ódio (cf. Jo 19,12).
Eu então, abracei a sentença efetuada pelo povo, saí do tribunal com uma cruz em meus ombros, acompanhado de gritos e torturas. Em seguida, fui levado para um lugar chamado Gólgota, que significa “caveira” no idioma do nosso povo, e ali fui crucificado (cf. Jo 19,19).
Morri sedento dos corações dos homens
Ainda em clima de ódio, dor, desprezo e torturas, pude realizar mais um gesto profético. Do alto do madeiro, gritei: “Tenho sede!” (Jo 19,28). Havia ali uma vasilha cheia de um líquido, meio azedo e meio amargo. Mergulharam nele uma esponja, colocaram-na numa vara e levaram-na até a minha boca. Não tomei e declarei: “Enfim, tudo está consumado!” Ali mesmo, inclinei minha cabeça e consumei minha oferta amorosa (cf. Jo 19,30).
Morri por você, nunca se esqueça disso. E não há maior amor do que dar a vida pelos amigos (Jo 15,13). Minha mãe ficou ali e sempre de pé. Nenhuma mãe deveria presenciar uma cena como essa. Naturalmente falando, o previsível é que os pais morram antes de seus filhos. Ela sentia uma dor terrível. Só permaneceu de pé porque as palavras do anjo ditas a ela, há mais de trinta anos, eram de fato verdade: “Ela havia encontrado graças diante de Deus” (cf. Lc 1,26).
Era o dia da preparação para a Páscoa do nosso povo judeu. Eles queriam evitar que o meu corpo e de outros condenados ficassem na cruz durante o sábado, porque aquele sábado era um dia de festa solene. Então, pediram a Pilatos que mandasse quebrar-nos as pernas e nos tirassem da cruz. Os soldados foram e quebraram as pernas de um e depois do outro que foram crucificados comigo. Porém, ao aproximarem-se de mim, viram que eu já estava morto, então, não me quebraram as pernas; mas um dos soldados, talvez por precaução ou apenas por deboche, abriu-me o lado com uma lança, e logo jorrou sangue e água. Ele viu e deu testemunho. Tudo isso, para se cumprir as escrituras: “Eles olharão para aquele que transpassaram” (cf. Jo 19,31).
O sepulcro, cofre da maldade dos homens e do amor incansável de Deus
Um sepulcro é um lugar de descanso para uns, de fim e de falta de esperança para outros, depende da fé e do horizonte de sentido de cada povo. Naquele contexto, o sepulcro tornou-se um cofre feito pela maldade dos homens, todavia, tornou-se também o lugar onde se escondia um tesouro que eles desconheciam, Eu, Jesus Cristo, o Shalom do Pai.
Termino essa minha partilha desejando a você, que lê, um mergulho profundo e sincero no mistério da minha Paixão. Que o resultado desse mergulho seja um louvor agradecido e uma busca sincera por uma vida santa. Amém!
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