AIgreja Católica, no seu Compêndio de Doutrina Social, n.410, reza:“Aqueles que têm responsabilidades políticas não devem esquecer ousubestimar a dimensão moral da representação, que consiste no empenhode compartilhar a sorte do povo e em buscar a solução dos problemassociais. Nesta perspectiva, autoridade responsável significa tambémautoridade exercida mediante o recurso às virtudes que favorecem oexercício do poder com espírito de serviço (paciência, caridade,modéstia, moderação, esforço de partilha): uma autoridade exercida porpessoas capazes de assumir autenticamente, como finalidade do próprioagir, o bem comum e não o prestígio ou a aquisição de vantagenspessoais”. É incontestável e lamentável o déficit desta capacidademoral nos sistemas administrativos, público e privado. Está em faltapessoas de competência moral para o exercício de funções eresponsabilidades em vista do bem comum. Este déficit incontestávelestá revelando o descuido neste imprescindível investimento, a formaçãoda consciência moral cidadã.
Acompetência moral não cresce e não se consolida na proporção docrescimento das competências em matéria de administração e gestãomoderna. Nasce aí os comprometimentos nos funcionamentos, gerandodeformações terríveis como a corrupção política, uma das mais graves,corroendo os princípios da moral e as normas da justiça social. Há umcomprometimento generalizado do funcionamento do Estado, influindonegativamente na relação entre governantes e governados. A operaçãoJoão de Barro, uma de uma vergonhosa série, devassa em municípios pelodesvio de verbas e esquema de favorecimento, no quadro lamentável daorquestração da corrupção, por falta de conduta e envergadura moral,explicita, mais uma vez, “a razão de uma crescente desconfiança emrelação à política e aos seus representantes, com o conseqüenteenfraquecimento das instituições. A corrupção política distorce na raiza função das instituições representativas, porque as usa como terrenode barganha política entre solicitações clientelistas e favores degovernantes. Deste modo, as opções políticas favorecem os objetivosrestritos de quantos possuem os meios para influenciá-las e impedem arealização do bem comum de todos os cidadãos”, diz também o Compêndioda Doutrina Social da Igreja, n. 411.
Compreende-se,como diz o Documento de Aparecida n. 78, este fruto da V Conferênciados Bispos da América Latina e do Caribe, Aparecida 2007, uma dasrazões mais graves do porque “a vida social em convivência harmônica epacífica está se deteriorando gravemente em muitos países da AméricaLatina e do Caribe pelo crescimento da violência, que se manifesta emroubos, assaltos, seqüestros, e o que é mais grave, em assassinatos quea cada dia destroem mais vidas humanas e enchem de dor as famílias e asociedade inteira.
Aviolência se reveste de várias formas e tem diversos agentes: o crimeorganizado e o narcotráfico, grupos paramilitares, violência comumsobretudo na periferia das grandes cidades, violência de grupos juvenise crescente violência intra-familiar. Suas causas são múltiplas: aidolatria do dinheiro, o avanço de uma ideologia individualista eutilitarista, a falta de respeito pela dignidade de cada pessoa, adeterioração do tecido social, a corrupção inclusive nas forças daordem e a falta de políticas públicas de equidade social”. Nestecontexto se constata lamentavelmente o enfraquecimento dos partidospolíticos. Não estão conseguindo interpretar as aspirações da sociedadecivil orientando-a para o bem comum. Os partidos políticos não estãoconseguindo, como é próprio de sua identidade e missão, oferecer aoscidadãos a possibilidade efetiva de concorrer para a formação de opçõespolíticas.
Ospartidos políticos se tornam simples plataforma de projetos pessoais ede conchavos em função de garantir a indivíduos a oportunidade e a vezde galgar prestígio e de obter vantagens pessoais. Este fator,contracenando com o uso da máquina administrativa sem probidade,aumenta o desencanto com a política, avolumando o descrédito, com orisco de uma desconsideração pela participação na construção dosdestinos da sociedade civil. Está faltando gente com envergadura morale desenvoltura para prestar contas. Esta incapacidade tem raízes naidolatria do dinheiro e do poder.
Oevangelista Lucas, 16, 1-8, conta a parábola do administradorprevidente, acusado de esbanjar os bens do seu patrão. Quando ouviu aintimação ‘presta contas da tua administração, pois já não podes maisadministrar meus bens’, com medo das conseqüências, como o trabalhoduro ou a mendicância, age estultamente, como ‘os filhos deste mundoque são mais espertos que os filhos da luz’, acomodando tudo emvantagem própria e dos seus clientes. Está faltando gente, filhos daluz, transparentes, retos, vida honesta, capazes de prestar conta.
por Dom Walmor Oliveira de Azevedo, arcebispo metropolitano de Belo Horizonte