Há um tempo, encontrava-me numa profunda “noite da fé”. Quando, sem esperar, vi numa livraria um título que me chamou a atenção: “Virgem Maria, mãe em plenitude.”
Abri para ver do que se tratava e ao ler sobre o autor a identificação foi imediata. Sua espiritualidade carmelita, a profunda paixão pela pessoa do Espírito Santo e a sua ligação a Santa Teresinha do Menino Jesus diziam-me: este é o recurso para viver essa noite da alma.
E gostaria de partilhar, o motivo pelo qual você talvez esteja vivendo algo parecido e assim como eu, possa encontrar consolo nas palavras daquele homem, amigo de Deus.
Meditaremos sobre o sábado santo.
A liturgia nos propõe o silêncio e recolhimento para passar o sábado junto à Santíssima Virgem. Para permanecer ao seu lado e adentrar no mistério da sua alma, do seu coração.
A dor feriu todas as suas potencias. Afetivas, físicas, morais, intelectuais e espirituais. Tudo nela tende para Jesus, desde as suas entranhas de Mãe, que se estremecem, até o seu amor espiritual. Esta plenitude de amor que recebeu Maria vive o drama e a ele se associa.
A partir desse momento, o querido Beato, nos convida a usar as falas como diálogos oracionais e assim o faremos. Relacionando-nos com Maria em primeira pessoa.
“Santa Mãe, choram ao redor de vós”. As santas mulheres se lamentam diante desta pedra, que esconde Jesus a seu olhar. A noite cai, é preciso partir. E é João que se apodera de seu bem: “Ecce Mater tua, eis a tua mãe”. É a última palavra do Mestre. E a vós, Maria, ele disse: “Eis o teu filho”. Aliança esta que foi selada pela palavra do Mestre, pelo sangue e pela morte.
Penso que vós ó mãe, sois levada ao quarto superior na casa de Zebedeu, o quarto dos íntimos. Não há cadeiras, vós vos sentais no chão, sobre o solo e aí permaneceis. E vós pensais agora nos acontecimentos. Também ficaste surpresa pela rapidez dos acontecimentos, por aquele drama que se desenrolou em algumas horas: as hesitações de Pilatos, os gritos da multidão, a flagelação, a coroação de espinhos, a condenação.
Oh, que pressa em tudo isso! Quanta precipitação e agitação! É o inferno desencadeado, que usa de todos esses meios, de todo esse poder.
Estás meditando todos esses acontecimentos em nosso espírito como meditastes em Nazaré; os acontecimentos que cercaram o nascimento de Jesus e sua apresentação no templo. Vós estais habituada a esta meditação em vosso coração espírito. Eis-vos absorvida e silenciosa, revendo e revivendo tudo. E estás sozinha. Outrora reviveis os acontecimentos com Jesus em vossos braços, com Jesus perto de vós. Ele não está mais.
Vós tendes consciência de vossa solidão ó Maria… O quanto é dolorosa. Estás aí sozinha!
Eis que essa solidão se povoa… De quê? Oh, de uma esperança viva e forte que está em vosso coração: “Dominus Tecum“: O Espírito está convosco. É ele o princípio de vossa fecundidade e por ele que recebereis agora o Cristo.
“É vossa maternidade, ó Maria, que se desabrocha a medida do mundo, à medida do sacrifício de Jesus. O demônio e as forças do inferno pareceram vos negligenciar sobre o Calvário, pareciam ignorar vossa presença. Tinham tanto a fazer junto a Jesus e sobre Jesus. No entanto, vós estáveis de pé. Vossa aparência fraca, vossa qualidade de mulher, vos colocaram ao abrigo. As forças do inferno velam sobre o túmulo: a guarda está lá, os demônios estão lá. Os soldados têm junto deles e com eles as legiões do inferno.”
Diante das noites, das dores e das inúmeras batalhas travadas temos Maria. Em meio a dor das perseguições e das ofensas, mesmo que não as vejamos, estamos sendo gerados para a santidade, nesse ventre espiritual bendito que gerou o filho de Deus:
“Ó Maria, deixa-nos aproximar de vós. Vós tendes João, e nós queremos representar a Igreja. Deixai-nos ver o que vós estais a ponto de vos tornar. Nós o sabemos, vós estais no momento de vos tornar Mãe da vida. Assentada no chão, acabrunhado por vossa dor silenciosa, dolorosa e grave, eis aqui nossa mãe, eis Nossa Senhora da Vida.”
Nossa Senhora nos ensina que quando tudo for escombros queimados pelo fogo das purificações é possível, ainda assim, contemplar o futuro com esperança.
Sua dor profunda não está isenta de esperança na promessa daquele que é o Esposo da Igreja. A espada de dor que lhe atravessou a alma não roubou sua identidade de mulher aberta à vida, não a rouba de sua missão. Ao contrário, como o mundo espiritual é feito de contrários aos olhos humanos, é justamente nesse sacrifício que nascemos nós, os filhos redimidos:
“Ó Maria, ó Nossa Senhora da Vida, ó nossa Mãe, nós esperamos um olhar, um olhar maternal. Jesus vos olhou do Calvário, e vos disse: “Eis teu filho”, este vosso filho somos nós… Que o olhar que vós pousareis sobre nós, esse olhar seja de adoção. Mostrai-nos as leis da geração espiritual, dessa geração que se opera na obscuridade, na noite e no sofrimento. Fazei-nos compreender, para que saibamos vos imitar mesmo nisso, vos prolongar no mundo; que saibamos também nós, à medida de vossa graça, gerar almas convosco.”
Maria sabe gerar-nos para Deus. Quando tudo é escuridão, esse caminho que os santos trilharam, foi também trilhado por ela e, de Deus, recebe a missão de ser a aurora que antecede o sol.
A esperança que povoava o coração de Maria antecipava nela os efeitos da alegria da Ressurreição. Por isso na noite do espírito, ela pode ser o sustento até a hora de Deus; de ele chegar e tirar a alma da escuridão:
“Maria é perfeita em intervir, sem perturbar, a realização dos desígnios de Deus, sem diminuir o poder benfazejo de sua luz nem eficácia de sua ação. Ela intervém, certamente, quão delicadamente sutis e ternas são suas manifestações! É uma coincidência aparentemente acidental, um apaziguamento repentino, uma luz, um encontro, algo aparentemente insignificante, mas no qual a alma reconhece com certeza a ação, o sorriso, o perfume e, portanto, a presença de sua Mãe. Sombra silenciosa na noite.”
Que a esperança de Maria povoe nosso coração. Seja qual for a experiência de morte que estejamos vivendo. Ela recebeu de Deus a fecundidade para nos gerar para a vida que está além das aparentes vitórias desse mundo:
“Difundi, ó Virgem Maria, sobre nossas almas, enchei-nos desta vida, fazei a triunfar de todas as impurezas, que estão ainda em nós, de toda desordem que está ainda em nosso ser. Quando nós nos abandonamos, não às nossas impressões, mas ao que vemos na obscuridade, o mistério do futuro, nós prevemos que do seio da Virgem jorrarão ondas da vida, tão abundantes e tão poderosas que parecerão uma torrente.”
Referências:Virgem Maria, mãe em plenitude Maria, mãe de misericórdia nas horas sombrias-In Je veux voir Dieu
Viviane Lopes
Consagrada cal – Shalom Aparecida