“Minha vida, pois, um disparo para a eternidade”, Santo Alberto Hurtado
Ao falar sobre esse santo chileno, talvez a primeira lembrança que venha à mente daqueles que conhecem um pouco sobre sua vida, são suas obras sociais, todo o trabalho realizado junto aos mais pobres, aos operários e também aos jovens. Porém, sua vida foi muito mais que isso. Desde muito cedo sentia em seu coração uma profunda inquietação, aquela Voz que chama, que interpela, que apaixona, como fez com o jovem Samuel (cf. 1 Sm 3,4), como fez com tantos ao longo da história. Ele sabia que Deus dá a cada um lugar, uma missão particular e as graças correspondentes para viver e cumprir essa missão, por isso se coloca diante de Deus com uma oração simples e de profundo abandono:
“Eu te faço a entrega de tudo o que sou e possuo, eu desejo dar-te tudo, servir-te onde não tenha nenhuma restrição em meu dom total”.
Alberto sentia em seu coração um desejo ardente de fazer a vontade de Deus, sentia-se chamado ao sacerdócio, desejava ingressar no noviciado dos jesuítas, mas se via impedido porque necessitava sustentar financeiramente a sua família. Seu pai havia falecido quando ele tinha apenas quatro anos e, como filho mais velho, trazia a responsabilidade de cuidar de sua mãe e de seu irmão menor.
Cursou direito na Pontifícia Universidade Católica porque trazia essa constante preocupação com os mais pobres. Ele se envolveu intensamente na vida universitária, nos grupos de estudo, nos apostolados e nas atividades políticas. Soube como unir sua carreira à sua inquietação por ajudar aos outros, formando com outros estudantes consultórios jurídicos que atendiam aos operários gratuitamente. Sua vida de união profunda com Deus o arrastava para os que mais sofrem.
A intensa vida universitária, no entanto, nunca o fez perder de vista aquela Voz que o chamava e fazia arder seu coração. Durante todo o mês do Sagrado Coração, rezava fervorosamente pedindo a Deus uma intervenção sobre os problemas econômicos de sua família, como testemunha seu diretor espiritual:
“Durante todo o Mês do Sagrado Coração de Jesus, do ano de 1923, às 10 da noite, vi-o estender-se no chão, diante do Santíssimo Sacramento, e passar uma hora inteira nessa postura, implorando, na oração mais fervorosa, que o Senhor solucionasse os seus problemas econômicos para poder consagrar-se totalmente a Deus”.
E exatamente no dia do Sagrado Coração, chegou a resposta providencial de Deus, solucionando o problema de sua família.
Ingressou no Noviciado Jesuíta no dia 15 de agosto de 1923, dia da Assunção de Maria, como sinal de sua filial confiança e estreita amizade com a Santíssima Virgem que o acompanharia durante toda sua vida.
“Querido Manuel: por fim aqui estou como jesuíta, feliz e contente como não se pode ser mais nesta terra: transbordo de alegria e não me canso de agradecer a Nosso Senhor porque me trouxe a este verdadeiro paraíso, onde a gente pode dedicar-se a Ele nas 24 horas do dia. Tu podes compreender o meu estado de ânimo nestes dias; dizendo-te que quase chorei de gozo”. Assim se expressa em uma carta a seu melhor amigo logo depois de sua entrada nos jesuítas.
Do seu tempo de noviciado são muitos os testemunhos de uma vida de virtude e oração, “pedia os trabalhos humildes da cozinha”, “tão abnegado, tão caritativo, tão trabalhador, tão zeloso da glória de Deus e do bem dos seus próximos, e, como fundamento de tudo, tão sobrenatural, unido com Deus e piedoso, principalmente em sua devoção à Santíssima Virgem”.
Seus companheiros de estudo desse tempo sempre queriam estar com ele, porque era de caráter agradável, estava sempre sorrindo e com um olhar indagador que os impulsionava a se questionar e querer fazer sempre mais e melhores coisas por amor ao Senhor.
Existia em seu interior um fogo constante que abrasava seu coração de amor a Deus e aos outros.
Seu apostolado com os jovens era marcado por esse amor intenso que o caracterizava, sempre impelindo-os a buscar com afinco a vontade de Deus, a buscar fazer todas as coisas “como faria Cristo no seu lugar”. Organiza grupos e retiros para os jovens, assim como as grandes procissões aos pés da Imaculada Conceição no Cerro San Cristóbal, no coração de Santiago. Em uma dessas ocasiões, olhando para a escuridão que envolvia a cidade logo abaixo, lhes disse: “Se Cristo descendesse nesta noite escaldada de emoção, repetiria, olhando a cidade escura: ‘Tenho compaixão dela’, e dirigindo-se a vocês diria com ternura infinita: ‘Vocês são a luz do mundo… Vocês são os que devem iluminar estas trevas. Querem colaborar comigo? Querem ser meus apóstolos?”.
O Hogar de Cristo (Lar de Cristo), surge de uma experiência com um pobre que se aproxima em uma noite chuvosa e fria, enfermo e sem um lugar para se amparar: “Cristo vaga por nossas ruas na pessoa de tantos pobres, enfermos, desalojados do seu mísero cortiço… Cristo não tem lar!” São suas palavras cheias de ardor e zelo em um retiro para senhoras do Apostolado Popular e logo após o fim do retiro, as mesmas senhoras fazem as primeiras doações, terrenos, cheques e jóias, fazendo assim nascer o Lar de Cristo.
A intensa vida apostólica de Santo Alberto, nada mais era que um transbordar da enorme riqueza espiritual em que estava arraigada.
“Se alguém começou a viver para Deus em abnegação e amor pelos outros, todas as misérias marcarão um encontro na sua porta… Sou com freqüência como uma rocha golpeada por todos os lados pelas ondas que sobem. Não fica mais escapada que por cima. Durante uma hora, durante um dia, deixo que as ondas açoitem a rocha; não olho o horizonte, só olho para cima, para Deus. Ó bendita vida ativa, toda consagrada ao meu Deus, toda entregue aos homens, e cujo excesso mesmo conduz-me para encontrar-me a dirigir-me para Deus! Ele é a única saída possível para as minhas preocupações, meu único refúgio”.
Alberto foi diagnosticado com câncer incurável e diante da notícia sua postura não foi outra senão a da gratidão. “Como não vou ficar contente! Como não estar agradecido com Deus! Em lugar de uma morte violenta, manda-me uma longa enfermidade para que possa preparar-me; não me dá dores; dá-me o gosto de ver tantos amigos, de vê-los todos. Verdadeiramente, Deus tem sido para mim um Pai carinhoso, o melhor dos pais”.
No dia 18 de agosto de 1959, faz sua páscoa santamente cercado pelos irmãos de sua comunidade, entra na eternidade, naquela que havia sido o anelo constante de sua alma e para onde ele apontava com sua vida e apostolado.
“E eu? Diante de mim, a eternidade. Depois de mim, a eternidade. O meu existir, um suspiro entre duas eternidades. A minha vida, pois, um disparo para a eternidade. Não me apegar aqui, mas através de tudo olhar a vida ventura. Que todas as criaturas sejam transparentes e me deixem verdadeiramente ver Deus e a eternidade. Na hora em que se façam opacas, torno-me terreno e estou perdido. Depois de mim a eternidade. Para lá vou e muito cedo… Quando alguém pensa que muito cedo terminará o presente, tira uma conclusão: ser cidadãos do céu, não do solo”.
Na vida de Santo Alberto vemos que a santidade é possível, ela se constrói vivendo de maneira extraordinária o ordinário da nossa vida. Que pela intercessão de Santo Alberto Hurtado cresça nos corações o desejo pela santidade.
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