Mesmo seus discípulos mais fiéis, aqueles a quem escolhera e chamara pelo nome, com eleição eterna e eterno afeto, mesmo esses o abandonaram na cruz, com exceção de João. É que muitos naquela época, como muitos hoje, buscam o Senhor pelo que ele lhes pode dar e não pelo que eles podem “dar” ao Senhor. Buscam o Senhor em sua glória, mas fogem em sua cruz.
Para entendermos bem esse mistério de troca de amor, é preciso saber que o Senhor assumiu nossa humanidade e jamais irá separar-se dela. Jesus, para sempre e sempre, é Deus e homem. É também, cabeça da Igreja, isso é, nossa cabeça, aquele a quem seguimos. Isso, somado ao milagre cotidiano da Eucaristia, significa que o Senhor que se fez carne, partilha conosco toda nossa vida: sofrimentos e alegrias, dores e felicidade.
A partilha de amor, como sabemos, jamais é unilateral. É exatamente porque Jesus nos ama que partilha conosco sua glória: as curas, os milagres, as ressurreições no corpo e na alma, na Igreja, na sociedade, na natureza. Porém, a partilha de sua cruz é o fundamento mesmo de seu amor por nós e do nosso por ele.
Ao encarnar-se, assumiu para si nossa maior podridão, nossa mais poderosa fonte de sofrimento e causa de nossa morte: o pecado. Sem jamais ter pecado, tomou sobre si, em sua paixão e cruz, todo o sofrimento e morte que o pecado havia feito entrar no mundo. O resultado foi sua morte na cruz e sua ressurreição.
Nós, como corpo de Cristo, somos chamados a amá-lo como corpo de seu corpo, alma de sua alma, como esposa, como Igreja. O amor, entretanto, consiste em estar presente tanto na gloria quanto na dor. É verdade que nossos atos de amor a Cristo não acrescentam nada à sua cruz. Entretanto, acrescentam – e muito – à nossa salvação e à do mundo. É nesse sentido que São Paulo diz: “Suporto em minha carne o sofrimento que faltou à cruz de Cristo”.
Em nossa vida, não precisamos buscar sofrimentos, não é verdade? Eles simplesmente nos alcançam de todas as formas, como consequência do pecado que marcou toda a natureza. A grande boa nova é que podemos, pela cruz de Cristo, nos libertar desse sofrimento exatamente como ele mesmo se libertou: sofrendo-o com ele e com o Pai e tomando, com ele, nossa cruz. Mas atenção: o sofrimento só se transforma em cruz com duas condições: primeira, que o unamos à cruz de Cristo, que vence o pecado, a dor e a morte; segunda, que o transformemos em ato de amor a ele e aos homens que ainda não o conhecem, isto é, que o amam e obedecem.
O mais lindo nessa história toda é que, ao buscarmos Cristo não somente em sua glória, mas também em sua cruz, seremos dignos dela e dele. Ou seja, viveremos uma vida de entrega de amor a Cristo por amor ao homem. O mais belo, porém, é que ao abraçar a cruz de Cristo através de nossos sofrimentos de cada dia, do menorzinho ao maior de todos, estaremos caminhando para … a sua glória.
Isso mesmo! O caminho para a glória de Cristo e do céu é unir-se em amor a ele, abraçando por amor o sofrimento que ele abraçou em sua paixão. Não há outro caminho para a glória. E não há glória autêntica que não seja a de Cristo. É por isso que, com razão, o santo diz: se só busca a Cristo em sua glória, então, não és digno de sua cruz. O contrário também é verdadeiro: se buscas a Cristo em sua cruz, serás digno de sua glória.
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