O trabalho é sem dúvida a atividade essencial do ser humano. Além de oferecer o desenvolvimento dos talentos inerentes de cada pessoa, o trabalho também pode oferecer a possibilidade de sustentação financeira, a organização de um lar, e entre outras coisas, o aprimoramento de toda uma sociedade. É importante reparar como o sentido de trabalho está intimamente ligado a natureza do homem e como a necessidade ou não de trabalhar não define a vontade humana de desenvolver-se e de desenvolver a sociedade através de seu empenho, seja ele manual ou intelectual. Para nós essa é uma das características do chamado de Deus ao trabalho como vocação de todos. É por isso que precisamos ainda observar que independente dos anseios do homem pelo trabalho, suas preocupações e projetos, ambições ou necessidades, o trabalho dentro da divina ótica deve ser sempre visto como uma dádiva e uma honra a ser valorizada, e por isso mesmo é triste pensar que são muitos os que não acreditam que é possível transformar o trabalho em momento de encontro com Deus.
Parece que na nossa atual sociedade existe uma crescente visão negativa acerca do trabalho e das duras penas que muitas vezes sofremos por sua custa. E é verdade que não obstante esse espírito de preguiça que paira no ar, adicionando as dificuldades de se encontrar um trabalho em nossas penosas realidades, pode parecer quase impossível enxergar na atividade profissional um momento para encontrar a Deus e a sí mesmo. Contudo, se estudarmos bem a escola dos santos, poderemos ver que sempre existe a chance de se transformar tudo pelo toque do amor. Como diria Madre Teresa de Calcutá, “não somos chamados para fazer grandes coisas, apenas pequenas coisas com grande amor”. Sendo assim, o trabalho visto como momento reservado para a perfeita plenificação da vocação humana, é sem dúvida fonte inesgostável de sentido e de paz já que o seu momento para estar unido com Deus acontece aí mesmo, nas aspirações do dia-a-dia. São Josemaria Escrivá diria: “recebestes o chamamento de Deus para um caminho concreto: se meter em todas as encruzilhadas do mundo, estando tu partindo do teu trabalho profissional metido em Deus”.
Para o cristão, o trabalho deve ser visto como a oportunidade de cooperação entre o Deus criador e o homem senhor da criação. Além disso, o mesmo cristão pode enxergar na atividade profissional esse momento de oração e crescimento em virtude, já que é aí, nas rotinas do cotidiano que ele busca a perfeição lutando contra o desânimo, perigosa tentação, a preguiça, a desordem e a inconstância.
Visto assim o trabalho é seguramente uma escola de santidade já que é aí que o cristão vive o cansaço, a decepção, a humilhação e o sofrimento e tem ao mesmo tempo a possibilidade de viver o evangelho acrescentando em cada uma dessas situações que o próprio Cristo passou, as graças que Deus nos derrama sempre: esperança, fé e caridade. Aquele que sabe aproveitar o empenho do trabalho para crescer em virtude e santidade, pouco a pouco forja uma personalidade madura, um caráter sublime e cria a ocasião para testemunhar a dignidade restaurada por Cristo no homem, e a oportunidade de santificar-se no trabalho, santificar o trabalho e santificar os outros no trabalho, como diria São JoséMaria Escrivá.
Outra lição que Deus nos ensina em sua passagem por nós é que importa mais a quantidade de amor que se coloca em cada trabalho, do que a própria atividade em sí. Diria São José Maria Escrivá que “Deus escolheu uma profissão simples para nos dar entender que é o amor de Deus que dá transcendência as nossas ações” *. Humanamente falando, o trabalho de Jesus não foi o mais importante, não apresentava muitas perspectivas e nem possibilidades de carreira e crescimento diante do mundo, já que era um simples carpinteiro. Ele seguramente passou 30 anos acordando cedo, experimentando a sensação de sono e cansaço diário, rotina e monotonia, dia após dia. Contudo Nosso Senhor amava seu trabalho diário e sabia que somente santificando o empenho de cada momento é que seria possível glorificar o Pai do céu. Tudo isso como Ele mesmo nos confirmaria depois, falando sobre a importância de testemunhar nossas atividades corriqueiras com perfeição, procurando oferecer ao próprio Deus esse empenho como oração palpável e concreta: “para que todos vejam as vossas boas obras e glorifiquem vosso Pai que está no céu” (Mat 5,16).
Chegando neste momento poderíamos nos perguntar, o que são essas boas obras? Sem dúvida é fazer o que se deve, e estar no que se faz, como diria o já referido Santo. É necessário primeiro, que todos nós façamos e cumpramos cada um dos nossos deveres cotidianos, por mais chatos ou ingratos que possam parecer. Mas não apenas isso, porque seria tornar o trabalho uma rotina vazia e sem sentido, e é aí que Deus e a sua graça entra: estar no que se faz. É preciso estar totalmente em cada pequena atividade do dia a dia, colocar-se totalmente com energia e vontade de cumpri-la com perfeição, oferecendo ao próprio Deus essa oportunidade de elevar o trabalho ao nível do sobrenatural. Chegar no trabalho no horário, realizar as nossas atividades com empenho e boa vontade, manter a concentração no que se faz, elevar o ânimo, oferecer ajuda quando o nosso trabalho já está terminado, sorrir quando se quer chorar para fazer o outro mais feliz entre outros atos de amor para consigo mesmo, com o próximo e com o próprio Deus é cumprir com perfeição essas boas obras. Fazer do nosso ofício uma oração e das nossas ações profissionais, atos feitos na presença do Pai mostrará aos nossos irmãos de trabalho que Deus os quer, que os Ama e que os chama. Isso sim é ser um outro Cristo para aqueles que nos rodeiam. Quando Santa Terezinha do Menino Jesus descobriu que não havia diferença entre fritar um ovo ou orar, colocou tanto empenho e tanta perfeição em cada pequena atitude do cotidiano que aos poucos as outras irmãs do Carmelo começaram e enxergar nela uma verdadeira santa, um outro Cristo.
“Temos que ganhar o céu com os nossos afazeres profissionais” diria São JoséMaria. Inspirado pela Palavra de Deus que diz “se tiver qualquer defeito não o oferecereis, pois não seria digno Dele“(Lev 22, 20), este santo bem sabia que não teríamos outra chance de encontrarmos a Deus senão pelo trabalho e pela oração. E é lógico, para nosso querido Pai temos que oferecer sempre o melhor, mesmo dentro das nossas limitações, nos preocupando sempre de o fazê-lo com grande perfeição. Uma tarefa cumprida e impecável**, não pode senão gerar paz e tranquilidade na nossa alma.
Por fim peçamos a Deus que nos ensine que é o amor que converte o nosso trabalho em oração, esse mesmo Amor que é o próprio Deus em pessoa. O Espiríto Santo, hóspede da nossa alma, aquele que nos faz filhos de Deus, agente transformador, nos ajude nessa vivífica transformação. Que o nosso trabalho seja sinal visível da presença de Deus no mundo e momento profundo de nosso encontro com Jesus. Assim seja.
“Aquele que não encontra Deus no trabalho e vida ordinária, não encontra Deus em lugar nenhum”. S.José Maria Escrivá.
Por: Silvio Medeiros/Karen Fernandes