Para mim é sempre difícil escutar com atenção amorosa os que me falam, sejam os que me procuram pessoalmente, seja quem me escreve e-mail ou me envia WhatsApp, ou ainda por telefone… Mas o que para mim é mais difícil é entrar na escuta de Deus, que fala sempre com voz tênue ao meu coração endurecido, no meu ouvido interior. Eu me pergunto: por que o nosso mundo não escuta mais? Não sou um sociólogo, que se interessa e saiba interpretar as questões sociológicas, e nem um psicanalista, sou uma pobre carmelita descalço que anda pelas estradas do mundo e que sente chamado forte a viver em inteira comunhão com o Deus da palavra e do silêncio.
Creio, porém que um dos motivos que dificultam a escuta seja o forte orgulho da autossuficiência que domina a nossa realidade. Queremos não escutar os outros nem a Deus, queremos escutar a nós mesmos… E escutamos os outros quando dizem “amém” aos nossos projetos e sonhos, quando concordam conosco. O Papa Francisco nos fala continuamente da necessidade de criar um espaço através do diálogo que é sempre constituinte de momentos importantes. Um momento em que nos dispomos a escutar sem preconceito, com o coração aberto e pronto a ouvir o que o outro nos diz, e outro momento em que nós falamos e o outro se dispõe a nos escutar. E só depois podemos começar o diálogo na busca da verdade…. Em tudo há sempre sementes de verdade que podem ser acolhidas.
A imposição nunca é o caminho que Deus escolhe e nem os homens e mulheres sábios devem escolher. Não é fácil o diálogo. Vivemos num mundo de manipulação das palavras, onde as palavras não têm o significado original, mas são manipuladas a partir da nossa visão estreita, quer seja de Deus, quer seja da pessoa humana. Deus nunca impõe. Ele nos deixa sempre a liberdade de aceitar ou não aceitar. Esta liberdade é o sinal mais profundo do amor que gera a vida em nós. Vamos nos colocar numa atitude de escuta da mensagem que Deus Amor repete ao ser humano desde o início da sua história e continuará a repetir até o fim do mundo, mas sem manipulá-lo nem o obrigar. Deixar o outro livre é puro amor. Mesmo quando o outro decide de tomar outro caminho… E aí se amamos corremos atrás dele como bons pastores que buscam a ovelha perdida, ou quem sabe às vezes estamos na varanda olhando o horizonte à espera que o filho que abandonou a casa um dia retorne…. Quem ama nunca perde a esperança.
Nem acrescentar e nem tirar; a Escritura não falha
Os profetas, começando por Moisés, são os melhores biblistas. Eles não manipulam, não discutem a Palavra de Deus, mas como sábios embaixadores a refletem sem se cansar. Interpretar a Palavra de Deus não quer dizer mudá-la, mas tentar encará-la na vida de cada dia, no evoluir do tempo e da história, deixando que o seu conteúdo permaneça inalterável. “Escuta, Israel”, esse é o grito de Deus e do profeta. Os mandamentos do Senhor devem ser repetidos até se gravarem nos corações e se tornarem vida, sopro e carne. A ordem é clara: não acrescenteis nada, não tireis nada, observareis tudo quanto o Senhor tem mandado, e os outros vendo a vossa fidelidade a Deus conhecerão quem é Deus pela sua fidelidade. Mesmo se o homem não observar e viver a infidelidade, Deus sempre será fiel. Um Deus que muda não seria mais um Deus. O povo de Israel será sábio e grande à medida que observar a Palavra do Senhor…. Não pela força e nem pelas armas… Hoje a Igreja, novo povo de Israel, não tem necessidade nem de exércitos nem de armas, mas de fidelidade à Palavra da vida e de ser paz, amor e unidade. A força da Igreja e do povo de Deus não é o dinheiro, é a vida e a santidade. Como é belo tudo isso e como nos dá força nas dificuldades. O dinheiro é um pobre meio e quanto menos o valorizamos melhor é.
A transparência da religião
Não é difícil se convencer de que o apóstolo Tiago não era uma pessoa fácil e nem tinha papas na língua; ele dizia a verdade e falava forte, levantava a sua voz contra todo tipo de injustiça. Neste trecho da carta temos uma ‘transcendência’ da religião. Qual é o agir de quem vive a Palavra de Deus que foi plantada em nós? É um agir que deve dar frutos abundantes. ‘Visitar os órfãos e as viúvas nos momentos de sofrimento, não se deixar contaminar por este mundo…’ Ponto final. A caridade é tudo. Os discursos servem para poucos. Mas visitar os órfãos, os pobres, os doentes de mãos vazias não servem. O estômago não se enche com palavras e nem o frio se repara com música. Fé e ação devem estar sempre juntas. Discutir menos e fazer mais Os juristas se preocupam com a observância das leis, os que amam a Deus se preocupam em viver a Palavra do Senhor, ser transigentes diante de Deus. O pecado não está fora de nós, nos recorda Jesus com uma firmeza e com exemplo duro e real, o alimento que entra no homem não é impuro, entra no estômago e é eliminado posteriormente. Acabou. É o que sai do coração do homem que é pecado, o que sai do nosso coração. Eis a lista: impurezas, furtos, homicídios, adultérios, maldade, mentira, dissolução, inveja, calúnia, soberba, estupidez…. Creio que é suficiente… isso devemos evitar com força e coragem e não nos importar se as mãos estão limpas ou não. Tudo isto sai do coração do homem e o contamina e o torna indigno de sua vida.
Oração
Não encontraremos o Senhor multiplicando práticas religiosas, como jejuns e orações, como as mil Ave-Marias, se depois de ter rezado continuamos a fazer o mal e a destruir os outros…. Esse é o momento de parar um pouco e de ver que não é suficiente o transplante de coração, mas sim o transplante para a vida cheia de amor e de sinceridade, de transparência. ESCUTA ISRAEL… E COLOCA EM PRÁTICA O QUE EU TE DIGO E SERÁS FELIZ. Estas palavras do Senhor não devemos jamais esquecer. Amém !