Era o fim de mais um dia no colégio. Andava bem reflexivo ultimamente, tudo por causa daquela experiência em um Seminário de Vida. E por que ficar pensando tanto nisso? Já tinha decidido que aquilo teria um lugar bem definido dentro da sua vida, já havia decidido onde ia encaixar o aspecto Deus e Igreja dentro dos seus outros tantos planos.
Caminhar para casa, rir com os amigos, reclamar dos trabalhos e dos professores, pensar no futuro e nas tantas fases que gostaria de passar e evoluir na sua vida. Era isso que queria, era isso que seus pais queriam. Já pensava na faculdade, estava perto do tempo do vestibular, já tinha suas três opções, mas no fundo, achava que já estava decidido… Mas era bom ter opções! Deixava aquele espaço de liberdade, de certo controle, pelo menos era assim que gostava de pensar.
Alguma coisa saiu do lugar
Mas à medida que passavam os meses, à medida que se envolvia mais com as coisas da Igreja e de Deus, alguma coisa saiu do lugar, seus planos já não se encaixavam mais no seu esquema, ele já não mais cabia em si. Era uma sensação estranha que tentou evitar reconhecer e acolher o máximo que podia, mas chegou no limite, não dava mais para fingir: Estudar para o vestibular… Evento no Shalom no próximo final de semana, preciso convidar mais pessoas… Conversar com aquele professor e ver sua opinião sobre qual daquelas universidades ele achava melhor… Já pensou evangelizar fora desta cidade pequena, num lugar onde as pessoas não estejam tão abertas ao cristianismo, outro estado, até mesmo outro país?!
Era uma divisão dentro de si, de pensamentos e desejos que incomodava, mas o fazia sentir-se vivo, feliz, empolgado! Passando um pouco mais o tempo, a divisão acabou não sendo mais tão igual, uma tendência mostrava-se bem mais forte do que outra: “Meu Deus, eu quero ser missionário”! Era uma loucura! E seus planos? E sua vida profissional? E seus estudos? E as coisas que queria ter? E seus amigos? E aquele sonho de se apaixonar, namorar e casar? E seus pais? Uma loucura!
Mas a ideia de dar a Deus só um pouquinho, o que cabia no seu esquema, parecia cada vez mais absurda. Deus é sempre tão generoso e cada experiência com Ele, quanto mais O conhecia, mais crescia um desejo de amar, retribuir com a vida. Era uma atração que superava suas perguntas e seu planejamento de vida pré-estabelecido. Tudo parecia mais cheio de sentido quando pensava na sua vida sob esta nova ótica: “Eu sou para Deus, e Ele quer me conduzir por uma via que eu não tinha imaginado, mas que quanto mais toco, mais quero”.
Que ano cheio de emoções!
Depois de muitas confusões interiores e medos. Depois de um grande receio de decepcionar seus pais, de frustrar os planos deles e de deixar o sonho de uma vida “bem sucedida”, resolveu entrar mesmo num caminho de discernimento vocacional. E que ano cheio de emoções! Boas e ruins! Descobertas e mais perguntas! Medo e paixão!
Em meio à tantos questionamentos, Deus lhe disse: “Em verdade vos digo: ninguém há que tenha deixado casa ou irmãos, ou irmãs, ou pai, ou mãe, ou filhos, ou terras por causa de mim e por causa do Evangelho que não receba, já nesta vida, cem vezes mais casas, irmãos, irmãs, mães, filhos e terras, com perseguições – e no século vindouro a vida eterna (Mc 10, 29-30)”.
Era isso! Confiar na promessa que Deus fez e partir nesta grande aventura de entregar a vida por amor, de seguir rumo à consagração. Refletiu sobre o que estava deixando, e acreditava que seus planos de vida eram bons, não eram contrários ao que Jesus pede, mas no seu caso, por causa da sua vocação, havia um chamado diferente. Sabia que Deus não o castigaria se ele resolvesse viver uma vida cristã normal, mas o apaixonava a ideia das surpresas que o Senhor tinha para Ele numa vida consagrada. Partiu em missão!
Loucura de amor! De amor esponsal!
Fácil? Nunca foi! Percebeu que cada tempo trazia desafios e graças diferentes. Como Deus é criativo! Alguns desafios e questionamentos se repetiam de tempos em tempos, estes eram mais doloridos. Tudo parecia se intensificar à medida que se aproximava das grandes decisões, dos grandes “sim”: como a consagração! Prometer diante do altar, ofertar a vida a Deus, por amor a Ele, pela Igreja, pelos jovens, por todos os homens, num caminho de obediência, castidade e pobreza. Loucura? Loucura de amor! De amor esponsal! De alguém conquistado pela Vontade de um Deus que propõe felicidade plena!
Engraçado que antes imaginava que a felicidade era alcançada na vida das pessoas como num jogo, em que alguém vai ganhando e passando de fase! Ou como uma escada, em que a cada conquista subia-se um degrau e ia se aproximando da felicidade! Pensou que só iria chegar perto da felicidade verdadeira depois dos trinta! Porque afinal, precisava de tempo para conquistar, ganhar, comprar, experimentar, amar, viver…
Deus mostrou que Ele não pensa e nem age assim! Jovem! Ainda longe dos trinta, mas experimentando de uma felicidade plena, vivendo coisas que nunca havia imaginado. Como pode ser? Foi o Senhor, o Autor da história, a Voz que chama, o responsável por ter dado a cada um, uma vocação. A dele era essa: Jovem e consagrado a Deus! Jovem e cheio de planos ofertados por amor a Deus, e cheio de planos dados por Deus. Jovem e experimentando na carne as dores das renúncias, e experimentando coisas maravilhosas que jamais viveria ou teria se não fosse a vida missionária.
Loucura? Loucura não! Vocação! Semente de vida eterna! Renúncia fecunda que constrói a imagem de Deus, pouco a pouco, a cada dia, naquele que diz sim. Jovem e consagrado! Que chamado desafiante! Que chamado feliz!
Baseado numa história real