Formação

Um novo tempo do sagrado – Texto para a oração (2ª semana)

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Foto: Arquivo Shalom

Revista Escuta, Conversão à santidade. Pág. 41 a 49. 

Dizia o Senhor na Escuta: “Sinto que o Senhor inaugura um novo tempo do Sagrado na Comunidade, como nunca foi visto antes. Um novo entendimento do Sagrado ligado à santidade”. O Sagrado foi sempre um elemento, claro, importantíssimo dentro da nossa vocação, porque, inclusive, nós somos consagrados. O Sagrado é o lugar onde Deus habita, onde está; é aquilo que é separado para Deus, tomado por Deus, possuído por Deus.

Sempre, desde o início da Comunidade, toda a dimensão do Sagrado, a dimensão de Deus, a primazia de Deus, a dimensão da consagração, a dimensão das nossas capelas, do culto divino, da oração, tudo o que dizia e diz respeito ao Sagrado, para nós, é a primazia, é essencial. Mas nós também não podemos negar que, no decorrer do tempo e da história, a nossa humanidade pode, muitas vezes, ir tornando ordinário aquilo que é extraordinário, que é o sentido do Sagrado, o sentido da presença de Deus no meio de nós. 

Podemos sentir, muitas vezes, que essa dimensão do Sagrado e da consagração, o sentido profundo destas duas realidades, pode estar se perdendo, ou não se perdendo, mas se fragilizando no nosso entendimento, na nossa vivência. O Senhor fez uma promessa, que Ele queria inaugurar um novo tempo do Sagrado. Onde podemos dizer que nós contemplamos, experimentamos, de uma maneira mais forte, o Sagrado? Na liturgia e na oração. O Senhor dizia na Escuta: “Neste tempo novo, Deus vai renovar e aprofundar todo o sentido do culto divino no meio de nós”.

O documento sobre a liturgia do Vaticano II, Sacrosanctum concilium, nos lembra: “Portanto, qualquer celebração litúrgica é, por ser obra de Cristo Sacerdote e do Seu corpo que é a Igreja…”, e a ação litúrgica é obra de quem? De Cristo Sacerdote e do Seu Corpo, que é a Igreja, de Cristo Sacerdote, que é a Cabeça, e do Seu Corpo, que é a Igreja. No culto divino, Jesus já está eternamente diante do Pai, com as Suas chagas, intercedendo por nós.

É o Cristo Sacerdote que está lá, perene na Trindade, eterno na Trindade. E nós, a Igreja militante, unimo-nos a Ele através do ministro, que faz, às vezes de Cristo Sacerdote, in persona Christi, e todo o corpo de Cristo. Porque quem dá, quem rende o louvor e quem oferta o sacrifício não é só a Cabeça, porque não vamos desmembrar Cristo. É a Cabeça com todo o corpo. “Portanto, qualquer celebração litúrgica é, por ser obra de Cristo sacerdote e do seu Corpo que é a Igreja, ação sagrada por excelência, cuja eficácia, com o mesmo título e no mesmo grau, não é igualada por nenhuma outra ação da Igreja”. Constituição conciliar Sacrosanctum concilium, sobre a Sagrada liturgia, n° 07.

A liturgia, a celebração dos sacramentos, é algo que não pode ser igualado a nenhuma outra ação da Igreja, porque ali, Deus, de uma maneira mais concreta, mais plena, é a fonte e o fim da nossa vida. Ali, na liturgia, o céu se une à terra, e, por isso, Cristo, na pessoa do sacerdote, e o Seu corpo, que é a assembleia, tudo devem fazer para tudo viver, para mergulhar, viver e ser santificados, salvos e santificados neste mistério. Por isso, desde o início da Comunidade, a liturgia tem um valor tão grande, mas que parece que corre o risco de estar sendo fragilizada. A preparação da liturgia, dos cantos, a não improvisação. Na liturgia da palavra, quem é que fala? É Cristo. Mas é Cristo mesmo que fala? E como é que, na hora da liturgia da palavra, Cristo falando, eu estou ensaiando o Salmo? Ensaiando porque não se prepararam para o maior ato de Cristo na vida da Igreja e na vida do mundo. Cristo está falando e eu estou aqui, mandando uma mensagem que esqueci, porque senão a panela lá no fogo vai queimar.

Cristo está agindo, porque na liturgia Cristo age, Cristo está agindo e o corpo de Cristo, que tem de estar agindo com Cristo, ou o próprio presidente da celebração, que deve agir por Cristo, com Cristo e em Cristo, Cabeça e corpo, todos juntos, não estamos dando todo o valor da grandeza do Sagrado. E aí vale um questionamento para todos nós. As nossas missas, nos nossos centros de evangelização: estamos vivendo o priorizar essas missas, essas missas que atraíram tantas e tantas e tantas pessoas ao nosso modo litúrgico de celebrar, a fidelidade ao nosso modo litúrgico de celebrar, da beleza, do cuidado com tudo o que é Sagrado? 

A beleza da liturgia, das celebrações… O Sagrado é belo! O Sagrado é  belo e atrai o coração, o olhar, a vida, toca a alma, toca e transforma, santifica! A beleza das missas nos nossos centros de evangelização, o cuidado com as coisas essenciais, o som, para que as pessoas possam participar bem, rezar bem, ser tocadas. Nosso Senhor quer falar e a palavra não chega bem. As homilias bem preparadas, bem cuidadas, não simplesmente um reconto do Evangelho, porque, às vezes, acontece, mas, sim, bem preparadas, cuidadas, para alcançar o coração do homem, para que a Palavra realize a obra que ela quer fazer.

A Missa bem celebrada no seu todo, e harmônica, que é onde não fica forte só uma parte e corre toda a outra, mas com toda a sua harmonia de beleza, porque em todas as partes está Cristo agindo no meio do Seu povo.O cuidado, o cuidado, o cuidado, o cuidado com as missas nos nossos centros de evangelização, com as missas nos eventos, porque ali o Sagrado se manifesta.

A Adoração ao Santíssimo, nós sabemos que ali é Deus! É Deus! É Deus! Com todas as outras coisas, vamos sendo mediadores. Ali a própria presença, o corpo e o sangue de Cristo, a Cruz e a Ressurreição, o mistério pascal acontece, e quando acontece, acontece para transformar. Eu acho que nós sempre tivemos uma graça muito grande. Quando, muitas vezes, setores da Igreja não valorizavam a beleza e a grandeza da liturgia, Deus nos deu a graça de reforçar isso.

Hoje nós vivemos um tempo em que existe um ritualismo, um rigorismo em relação à liturgia. É como se, ao invés da experiência com o mistério, a liturgia se transformasse num cumprimento de ritos. Se, no passado, nós poderíamos ter o risco de desprezar a santidade da liturgia e a beleza do mistério, hoje nós temos o risco de enrijecer e achar que a liturgia é só o rito, sem também cuidar de todo o mistério da liturgia.

Nas missas na nossa vida ordinária, é Cristo quem age. As nossas Laudes e completas, e as Laudes são liturgia, é Cristo quem atua, quem reza conosco.Não fazemos as nossas Laudes só para nós, porque, quando rezamos, nós rezamos com e por toda a Igreja e por todo o mundo. Nós rezamos por Cristo, com Cristo e em Cristo, e Cristo sempre reza com e por, com toda a Igreja e por toda a humanidade. As nossas Laudes não são só para mim. É uma participação da Comunidade no mistério da intercessão de Cristo pela salvação do mundo. As Completas, que em cada casa de CV são feitas, lembremos! É a nossa vida, mas não só a nossa vida.

Estamos trazendo, por Cristo, com Cristo e em Cristo, o rosto de muitos, a vida de muitos, e introduzindo tudo isso no Sagrado de Deus, na presença de Deus, no mistério, na Páscoa, no mistério Pascal, na Trindade, tudo! Nós encontramos o Sagrado na liturgia e na oração. Outro lugar em que encontramos o Sagrado: nós também encontramos o Sagrado nos consagrados.

Diz a Vita consecrata: “Através da profissão dos conselhos evangélicos”, no nosso caso também os celibatários fazem a profissão, mas todos nós fazemos uma consagração no Espírito, fazemos promessas no espírito dos conselhos evangélicos. “Através da profissão dos conselhos evangélicos, os traços característicos de Jesus virgem, pobre e obediente adquirem uma típica e permanente visibilidade no meio do mundo, e o olhar dos fiéis é atraído para aquele mistério do Reino de Deus que já atua na história, mas aguarda a sua plena realização nos céus”29. Os consagrados, nós somos, todos nós, somos chamados a transmitir a visibilidade da pobreza, da obediência e da castidade de Cristo no meio do mundo, para que, quando os homens olhem para nós, toquem no mistério do Reino que já atua na história, vejam e toquem em nós.

Esta também é uma pergunta que devemos nos fazer. Falamos, às vezes, da visibilidade da Comunidade, da visibilidade divina, mas você, você está sendo portador dela? As pessoas, ao olhar para nós, como Comunidade Católica Shalom, ao olhar para você, como consagrado, vão poder tocar nos detalhes, não simplesmente nas coisas exteriores? Talvez porque você use um clergyman, vão dizer: “É um padre”. Talvez porque você use um Tau, vão dizer: “É um consagrado da Comunidade de Vida ou de Aliança”.

Talvez você use o sinal, a aliança da Cruz: “É um celibatário do Reino”. Mas, e a nossa vida de consagrados, retirando os sinais exteriores… Como nós estamos dando visibilidade, pela nossa vida, no meio do mundo, para o mistério de Cristo que já atua na história, como pessoa e como Comunidade, cada um de nós? Terceiro lugar em que o Senhor deseja nos reanimar no sentido do Sagrado. Nós falamos da liturgia, da consagração. Onde Deus habita? Em nós. Nós somos templos do Espírito Santo, nós somos Igreja, mas quis Deus, habitando em nós, uma casa que reúne aqueles que são habitados e que se tornam, juntos, pedras vivas do grande templo, que são os espaços sagrados. 

Na Escuta, o Senhor dizia: “É um sentimento muito ligado ao culto, ao tempo, à adoração, à construção do templo”. Uma atenção especial às nossas capelas. Eu me lembro do nosso primeiro Acamp’s. Um caos! Foi um caos! Maravilhoso caos… Mas foi um caos. Eu me lembro de que, na primeira noite,eu não tinha nem coragem de me levantar, porque o dia anterior tinha sido tão caótico, que eu não tinha coragem. Eu sempre conto, porque eu tinha ido a São Paulo, conversado com um padre, e tinha dito: “Nós vamos fazer um acampamento de jovens numa fazenda”. O padre disse: “Você é louco? Vai colocar um monte de rapazes e moças trancados numa fazenda? Como é que você vai fazer? Você é louco!”. E aí, na chegada, aquele caos, eu passei a noite sonhando que eu era louco mesmo.

Eu me lembro de que, quando me levantei, estava tudo já montado, e o Senhor disse uma coisa no meu coração: “É. Vocês montaram as tendas de todos, mas não montaram a Minha. Montem primeiro a Minha”. No outro Acamp ́s fizemos a tenda do Senhor com o Santíssimo Sacramento,porque Ele queria acampar no meio de nós. Isso mostrava a primazia de Deus na nossa vida. De certa forma, o cuidado com as nossas capelas, o fazer das nossas capelas um encontro com Jesus, o Ressuscitado que passou pela Cruz, com todos os elementos do Carisma, o dar o melhor para as nossas capelas, é um reflexo do que é a primazia de Deus na nossa vida. É um reflexo.

Durante a partilha do nosso encontro, a Adalgisa foi falando toda a epopeia que foi a construção da capela do CEST, que até uma cobra acharam no meio, e que, faltando uma semana para começar o retiro, descobriu que uma tesoura estava comprometida (30 Armação de madeira em formato triangular, que se usa em telhados que cobrem vãos, sem o auxílio de paredes internas. 31 Nota do revisor:,) podia cair e matar todo mundo. Tiveram de refazer tudo do zero. Mas, quando nos colocamos na primazia do Sagrado, porque, quando damos a Deus o que é de Deus, isso é justiça, que é uma das vitudes segundo o CIC 1807, “A justiça é a virtude moral que consiste na vontade constante e firme virtudes da religião, quando colocamos Deus primeiro, todo o resto se ordena. Por isso, o inimigo bate muito aí, com batalhas contínuas, por não valorizarmos – e perdemos até – a dimensão do Sagrado.

A beleza das nossas capelas, a harmonia das nossas capelas, a revelação do carisma através das nossas capelas, de estar dentro delas, e, estando dentro delas, tudo favorecer para nos remeter ao mistério, ao Sagrado. E aí, a dimensão da Igreja que estamos construindo, que é essa expressão que talvez nós não nos demos conta, ainda, da sua importância. Talvez aqui, como no Acamp ́s, Deus esteja dizendo: “Vocês estão fazendo muitas coisas para Mim, mas e a Igreja, que é sinal do Carisma, sinal do Sagrado?” A revalorização de Deus como Deus, e é um absurdo dizer isso, mas essa é a verdade! Colocar Deus no lugar de Deus, saber dar a Deus e ao próximo o que lhes é devido. A justiça para com Deus chama-se virtude de religião….” (App [paraIOS] Pocket Catecismo – Catecismo da Igreja Católica).

Sagrado no lugar do Sagrado, nas nossas casas comunitárias, nas nossas células, nos nossos centros de evangelização, na Comunidade como um todo, na Diaconia, na Igreja que estamos construindo… Isso pode ser uma fonte revolucionária para a nossa vida e para a nossa missão como Comunidade. A necessidade da unidade para reconstruir o templo, necessidade dessa unidade para reconstruir o altar de Deus, o Sagrado, a primazia, o zelo pelo Sagrado. Que Deus nos dê essa unidade e essa primazia do Sagrado, que diz muito respeito a uma conversão à santidade.

Vimos a liturgia e a oração, os consagrados, o espaço sagrado. Um quarto ponto em que tocamos o Sagrado são os outros, porque os outros são um Sagrado para mim, especialmente aqueles que, para nós, são vigários de Cristo: os pobres e os jovens. A valorização de tudo o que, como Comunidade, fizermos em favor dos jovens e em favor dos pobres, é também um retornar ao Sagrado, mas sobre isso vamos falar mais para frente.

O Padre Antônio me pediu para lembrar também a dimensão dos sacramentais, a importância de não perder a noção daquilo que foi consagrado a Deus, começando pela Bíblia. Às vezes, as nossas Bíblias são tratadas de qualquer jeito, de qualquer forma; também os ícones, os terços que vão quebrando e jogamos no lixo. Foi abençoado; é um sacramental. A importância de valorizar o mistério de Deus.

 


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