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Acabo de ver uma série de fotos. Exibem o fato de que ahumanidade acaba de receber, aterrada, a versão 2004 da Pietà de Michelangelo.A principal foto da série exibe uma mãe que chora sua filha morta. A obra dogênio do Renascimento retrata a Mãe que chora, desconsolada, o Filho morto nosbraços, a atrocidade de que o homem se fez capaz. A obra do gênio do terrorretrata uma mãe que, como a Mãe, como Ramá, como as mães anônimas do massacredos inocentes, também mal tem o direito de chorar, desconsolada, aos pés dafilha morte, a atrocidade de que o homem, vinte séculos depois, ainda se fazcapaz.
A obra do italiano revela o traço poético e orante do autor:o Filho adulto, não traz as marcas do sangue e do horror da barbárie. Na doschechênios e árabes, traz, claras, as marcas do autor: sangue, gritos, rangerde dentes, hematomas, desidratação, mutilações, esfacelamentos, injustiça.
A Pietàitaliana traz a leveza do cinzel que a retirou da pedra, paciente, durantemeses de duro trabalho. A russa, o peso da violência que retira dos seusamados, impaciente, desrespeitosa, em poucos segundos de irresponsávelatrocidade, seus pequenos amados. A Pietà italiana mostra o Filho adulto quecumpriu sua missão. A russa, o filho infante que nem ainda a deslumbrou.
Imóvel, aPietà italiana, olhos grudados ao Filho, segura-o, inerte, ao colo, enquantoestende a mão esquerda como a mostrar o Filho. Também imóvel, a Pietà russaagacha-se, mão direita a acariciar a filha que o governo não lhe permite tomarao colo, enquanto dobra a mão esquerda sobre o próprio coração, como a mostrarseu esfacelamento. Revestida da brancura do mármore, assentada e com vestesesvoaçantes, a Pietà italiana como que toca o céu. Em vestes negras, a russa,acocorada em meio a outros corpos, de outros filhos, vestes que cobrem o chãoensangüentado, toca o inferno.
A Pietà byLaden, mais “moderna”, corre em busca de segundos de vida e toma outras formas.Reveste-se de pais, desesperados, a correr com os corpos dos filhos, naesperança de vida. Disfarça-se de soldados, rostos angustiados, a carregarpequenos seres esfacelados, esconde-se no rosto de pais impotentes e atônitos,debruçados sobre os corpos dos filhos de sua esperança. Mais uma vez, Ramachora seus filhos, pois eles não mais existem entre os vivos.
A Pietàitaliana é limpa e inodora. A russa, imunda e manchada, cheira a sangue fresco.A italiana eleva a alma. A russa subleva indignação.
À Pietàitalana, protegida por seu vidro blindado, contempla-se, em respeitososilêncio, sabendo-se diante de um mistério de beleza e verdade. À Pietà russa,desprotegida pelo desrespeito absoluto à pessoa humana, contempla-se, também aela, em respeitoso silêncio, sabendo-se diante de um mistério de horror ementira. Diante de ambas, só o silêncio e a oração: “Pai, perdoa-lhes! Elessabem muito bem o que fazem. Erram! Erram! Erram! No entanto, Pai, como estasRamás que choram seus filhos, nossos olhares se concentrem em Teu Filho e Dele tiremforças para não se permitirem levar pela revolta que quer mais sangue. Pois,Pai, diante de tal crueldade, o que poderá estancar a sangria senão o amor quedecide perdoar porque eles precisam de perdão?”