Dom Fernando Arêas Rifan
Napolêmica suscitada em torno da questão da menina violentada emPernambuco, alvo depois de um aborto provocado, há o perigo de sedesviar o foco do ponto central de toda a questão: a gravidade dopecado do aborto voluntário.
Considerando-seo feto como um ser humano, apesar de ainda em formação, – como, aliás,também o é um bebê recém-nascido – com código genético, conjunto decromossomos e personalidade independente da sua mãe, como o comprova aprópria ciência moderna, a sua morte provocada vem a se constituir emum voluntário e direto ato de se tirar a vida de um ser humanoinocente, ato ilícito perante a lei natural e a lei positiva de Deus.
Aconseqüência dessa consideração é que nada poderá justificar o tirardiretamente a vida de um inocente, nenhuma razão ou pretexto, por maislouváveis e bem intencionados que sejam, como proteger a vida deoutrem, salvar a honra de alguém, diminuir a pobreza da família, evitaro escândalo, etc. É princípio básico de moral que não se pode fazerdiretamente o mal para se obter um bem. E quando se trata deprincípios, não adianta tentar contradizê-lo apelando para argumentossentimentais.
Assim como a Igreja, Estado também considera como o maior bem a vida humana.
Aexcomunhão é uma pena aposta pela Igreja a um pecado grave, com oobjetivo de alertar os católicos sobre a gravidade de tal ato, no nossocaso, o pecado grave do aborto voluntário e o prejuízo irreparávelcausado ao inocente morto. Isso não quer dizer que outros pecadosgraves, que não tenham sobre si tal pena, sejam permitidos ou comculpabilidade diminuída. A Igreja está tomando a defesa de um inocente,que não tem voz nem outros meios de se defender, o feto no úteromaterno.
Masexiste sim uma gradação na gravidade dos pecados. Jesus disse a Pilatosque quem o havia entregue a ele tinha maior pecado do que ele, Pilatos(Jo 19,11).
DomJosé Cardoso Sobrinho, arcebispo de Olinda e Recife, que tem toda anossa solidariedade, não excomungou os que diretamente provocaram talaborto, apenas anunciou que tal ato constituía um delito canônicopunido automaticamente com a excomunhão. Nem muito menos defendeu ocrime hediondo do padrasto.
Ademais,há que se ter em conta uma segunda opinião de médicos abalizados: amenina não corria risco de vida imediato e a gravidez poderia ter sidolevada até mais adiante, quando os fetos já seriam consideradosviáveis, fazendo-se então até mesmo um parto cesariano, se fossepreciso. Assim se teriam salvado duas vidas, sem o trauma do abortopara a mãezinha e sem o pecado diante de Deus.
Infelizmente,só quem defendeu essas duas vidas que se perderam foi a Igreja. E a vozdelas foi a única que não se ergueu contra a Igreja.