«Para os judeus, é escândalo; para os gentios, é loucura; mas, para aqueles que são chamados, tanto judeus como gregos, é Cristo, poder de Deus e sabedoria de Deus.» (1 Cor 1, 23-24). Por que optar por uma vida celibatária nos tempos de hoje? Que sentido e necessidade há em escolher a radicalidade na castidade?
Num tempo em que a vida consagrada se manifesta na diversidade dos estados de vida na Igreja, em que as famílias cristãs são cada vez menos numerosas e em que tantas outras questões se levantam sobre a virgindade consagrada, essa escolha pode parecer uma loucura.
No entanto, é precisamente nesta aparente loucura que se manifesta a sabedoria de Deus. Ele continua a chamar homens e mulheres a ofertarem as suas vidas pelo Reino dos Céus, no celibato consagrado, para serem sinais vivos no meio de uma sociedade ferida por um «cristianismo relativizado» ou por um cristianismo que evita as renúncias necessárias pelo tesouro escondido do Reino.
Num pedaço de pão duro e pobre uma alegria incomum
Aos 17 anos, ao convite de jovens missionários numa escola de evangelização da Comunidade Católica Shalom, em Curitiba no Brasil, vivi uma experiência pessoal com O Ressuscitado que passou pela Cruz. Num simples lanche da tarde, ao partir do pão, vi num pedaço de pão duro e pobre uma alegria incomum que me intrigava:
«O que têm estes jovens pobres, que partilham um pão velho e duro, que eu não tenho?». Meses depois, num acampamento para jovens, durante um retiro, descobri um Amor que me amava e encontrei a resposta à minha inquietação: «Eles deixaram tudo, ofertaram as suas vidas pelo Reino dos Céus. Eu também quero ofertar a minha vida a Deus».
À medida que me entregava a este Amor, mais me apaixonava e desejava consumir a minha vida inteiramente por Ele. Assim, iniciei um caminho vocacional para discernir por onde Deus me conduzia na busca da santidade. Sou Marcelo Souza, filho de Deus, católico, missionário e consagrado da Comunidade Católica Shalom. No meio das atividades seculares para as quais Deus me envia, ardia em meu coração a Sua proximidade e a Sua vida em mim (cf. Lc 24, 32).
Eis a minha alegre loucura
Percebi que não bastava apenas estar aos pés da Cruz, mas que era necessário unir-me a Ele do outro lado da Cruz. Sentia o desejo de viver por inteiro e ser sinal do estado em que todos viveremos no Céu. Consciente das minhas fraquezas e misérias, que são muitas, Deus fez-me celibatário por amor ao Reino dos Céus (cf. Mt 19, 12). Eis a minha alegre loucura.
Para um mundo ferido, talvez seja uma opção inútil ou uma escolha desnecessária, mas para Deus é sabedoria, sinal de esperança e remédio para a alma da sociedade, tantas vezes marcada pelo «cristianismo light» (expressão do Papa Bento XVI), sem exigências, diluído e privado da sua identidade e radicalidade, favorecendo uma vivência acomodada e relativista da fé.
Celibato e sacerdócio
«Dentre os irmãos chamados ao celibato, o Senhor desperta vocações ao sacerdócio» (ECCSh, 113). Neste caminho de discernimento, o pão partido mais uma vez inquietou-me, e assim dispus-me a percorrer o caminho de descoberta da vocação presbiteral, para ser, no coração da Igreja, um sinal fecundo da vida consagrada e célibe, apontando para a escatologia cristã do Reino dos Céus. Sendo assim, sou Marcelo Souza, filho de Deus, católico, missionário e consagrado da Comunidade Católica Shalom, celibatário pelo Reino dos Céus e seminarista da Arquidiocese de Braga, em Portugal.
Esse é o caminho que Deus fez para mim, feliz e nem por isso ausente de sacrifícios e renúncias. Que grande alegria é saber que este discernimento não o faço sozinho: somos nós, eu, o Espírito Santo e todo o povo de Deus. Para mim, ser consagrado e ser celibatário há e faz sentido. «Posso, apesar da minha pequenez, aspirar à santidade, buscar as coisas do alto» (Santa Teresinha).
Marcelo Souza, CCSh
Consagrado CAL, Celibatário e Seminarista da Arquidiocese de Braga-Portugal.