Dom Anuar Battisti
Diante de situações bem pessoais, onde entra em jogo os interesses derealização, o desejo de fazer só o que gosto, de buscar aquilo queconsidero “bom” e penso que mereço; diante de tudo o que faço, penso esinto que seja bom para mim, cultiva-se um leve sentimento de soberaniae autossuficiência. No caminho de realização pessoal, não pode existirapenas o “eu”, como centro das atenções. Precisamos dar abertura para ooutro, aquele que faz o mesmo ou outro caminho.Ao lado destes sentimentos de autonomia e autorrealização, pode existira ganância de superioridade, galgando os degraus da independência.Depender do outro parece coisa do passado ou de gente ignorante.Ninguém veio ao mundo sozinho, dependemos em tudo, até o dia doencontro definitivo com o Criador.
No livro “A Cabana”, Wilian P. Youngrelata um diálogo entre Mark e Sarayu, que faz o papel do EspíritoSanto. Mark diz: “Agora posso ver que gastei a maior parte do meu tempoe da minha energia, tentando adquirir o que eu achava que era bom, comosegurança financeira, a saúde, a aposentadoria, ou sei lá o quê. Egastei uma quantidade gigantesca de energia e preocupação temendo o quedeterminei que era mau.E Sarayu, com gentileza disse: Quanta verdade há nisso! Lembre-se: Issopermite que vocês brinquem de Deus em sua independência. Por essarazão, uma parte de vocês prefere não me ver. E vocês não precisam demim para criar uma lista do que é bom e ruim. Mas precisam de mim, setiverem qualquer desejo de parar com essa ânsia tão insana deindependência. Então pergunta Mark: Há algum modo de consertar? Vocêdeve desistir de seu direito de decidir sobre o que é bom e ruim e,escolher viver apenas em mim (Espírito Santo). É um comprimido difícilde engolir. Para isso, você deve me conhecer o bastante, a ponto deconfiar em mim e aprender a se entregar à minha bondade infinita”.
O discernimento entre o que é bom e mau no direito de decidir, só podeser alicerçado nos valores que vão além do humano pensar e sentir. Nãoexiste realização pessoal ou satisfação em viver, sem que haja umrelacionamento firme e decidido com a luz de Deus e seu Espírito.Quantos erros cometemos com consequências negativas incalculáveis anível pessoal e comunitário, porque nos colocamos como deuses esenhores de nós e dos outros.
Somos o que somos por graça, e se “degraça recebemos também de graça devemos dar”. Devemos dar de nósmesmos, na abertura ao outro, a fim de baixar o nível de independênciae construir juntos o bem, que não está longe de nós. Parecebrincadeira, mas tem muita gente brincando de Deus. Diante da Palavraficamos calados, pois “não é aquele que diz: Senhor, Senhor que entraráno Reino, mas aquele que faz a vontade do Pai Deus”. O esquecimento deque somos criaturas e não criadores, colocados no mundo para povoar eaperfeiçoa a criação, faz com que, os absurdos da independência humanatomem lugar do respeito e do amor à criação e ao Criador. Deturpamoscom a maior tranquilidade o fim pelo qual existimos e somos. Perdemos ogrande horizonte da vida humana que é a busca de perfeição, e nosperdemos em meio às coisas passageiras tentando trazer para o aqui eagora, o que está reservado no paraíso.
Como diz Willam P. Young:“Comprimido difícil de engolir”, principalmente quando a pessoa humanabrinca de Deus. Ainda é tempo, você sabe que só tem um, descer do seupedestal de criador e assumir a sua condição de criatura.