Cardeal Geraldo Majella Agnelo
Estão vindo a público dramas humanos de meninas que engravidam após uma história de abusos por parte de padrastos e pais.
Aferida aberta em nossa sociedade que deve ser compreendida em suascausas, implicações e respostas operativas para reduzir esses casos queconstituem uma fonte de sofrimentos, humilhações e traumas tremendos.
O drama vivido por essas meninas e suas famílias nos provoca e questiona.
Oprimeiro passo quando se enfrentam essas situações, encaminhando-aspara o que parece a melhor solução do ponto de vista dos atoressociais, é compartilhar a dor das pessoas envolvidas, acolhendo-as,ouvindo suas histórias de sofrimentos, procurando compreender quaiscircunstâncias tornaram possíveis esses abusos.
Resulta desumano reduzir esses fatos a material para defender bandeiras, para marcar pontos nas batalhas ideológicas.
Também,a imposição de solução por parte de alguns adultos que não têm nenhumcompromisso maior com as pessoas envolvidas a não ser a emissão doparecer supostamente técnico e valorativamente neutro pode agravarainda mais o sofrimento dessas pessoas, tratadas como objeto, primeiropor familiares que delas abusaram e agora por estranhos, com o sistemade saúde interferindo com o propósito de promover o aborto a fim de“resolver” o problema, até contra a vontade das próprias meninas mães.
Valea pena perguntar-se porque acontecem abusos e violências em muitasfamílias nos dias de hoje. Que valores movem uma pessoa que abusa deuma criança indefesa e vulnerável ferindo-a no mais profundo de suaalma? Onde terá assimilado esses valores? Que escolas eles terãofreqüentado, que programas de rádio e de televisão eles terãoacompanhado, que igrejas eles terão seguido?
Tenho certeza que uma família cujos membros rezam juntos em casa aocomeçar o dia e de noite, preparando-se para dormir, que lêem oEvangelho, que procuram aprender a vida seguindo os ensinamentos deJesus Cristo, que freqüentam uma comunidade cristã ficaria livre dessesproblemas. Por isso a Igreja Católica está preocupada com aevangelização missionária em todo o Brasil, aliás, em todo o Continentelatino-americano.
Poroutro lado, a figura do pai foi tão desvalorizada e desprestigiada quepouco sobra hoje da nobreza de sua tarefa educativa. Se uma criança, umadolescente, um jovem, crescem entendendo que ser pai não significanada além de fornecer os gametas para a reprodução acontecer, se nãoassociam mais à sua condição de pai uma tarefa de fundamentalimportância, uma responsabilidade sagrada para introduzir a criança quegeraram à compreensão da realidade e da vida, conduzindo-a eacompanhando-a até a maturidade, então tudo pode acontecer. Faltando acompreensão da própria paternidade, a relação pode decair e ser vividacomo qualquer outra, não mais orientada pelo ideal da paternidade, masmovida pela busca de alguma vantagem ou de algum prazer.
Criançasgravemente abusadas pelas pessoas que mais delas deveriam cuidarquestionam a nossa maneira de construir a sociedade moderna, a obsessãocom a qual nos dedicamos a desconstruir tudo o que nos foi legado pelatradição ou possa relembrar o horizonte religioso da vida. Pelocontrário, parece-me extremamente saudável olhar para a paternidade deDeus, o Criador, o amor com o qual acompanha a cada um, Ele que sabeaté o número dos cabelos que estão em nossa cabeça. Ele pese o nossocoração segundo à ternura e à compaixão com a qual pede o nossocoração, muitas vezes ferido pelo ódio e pelo desamor, para curá-lo.Mas, aqui se abre o misterioso espaço da liberdade de cada pessoa, pararesponder ao Seu apelo ou recusá-lo. Jesus no livro do Apocalipse diz:“Eis que estou à porta e bato; se alguém ouvir a minha voz e abrir aporta, eu entrarei na sua casa e tomaremos a refeição, eu com ele e elecomigo” (AP 3, 20). Será verdade que para ser “moderno” é necessáriorecusar essa companhia potente e misericordiosa? Não será mais sábioquem nele confia e constrói sua vida sobre essa Rocha?
Nestequarto domingo da Quaresma, ouvimos o evangelho de João 12, 20-33:“Havia alguns gregos que vieram à Jerusalém e aproximaram-se de Filipee pediram: gostaríamos de ver Jesus” para ouvi-lo e quem sabe segui-lo.E nós?