Estereótipos, rótulos, fôrmas são, na melhor das hipóteses, tentativas de simplificar e compreender a realidade que nos cerca. Quando conseguimos caracterizar, categorizar, definir, classificar parece que a complexidade torna-se menos assustadora e assim, adquirimos certo domínio sobre os fenômenos.
Quando o assunto é maternidade, ao menos em um primeiro momento, trata-se de um tema menos complexo. Afinal, no mundo ideal, “Mãe é tudo igual, só muda o endereço”. Adjetivos relacionados à maternidade não faltam: ternura, bondade, desprendimento, amor, dedicação, confiança. No mundo real, podem existir ainda outros: medo, insegurança, culpa, abandono, rejeição, maus-tratos, indiferença, revolta.
Em geral, compreendemos com tranquilidade que cada filho é único. Porém, ainda resistimos em aceitar que cada mãe é igualmente única. Uma mulher, situada em um tempo e um espaço, com história pessoal própria e uma gama de potencialidades e limites que são postos em cheque a cada instante. A maternidade é, portanto, uma experiência única, situada no aqui e no agora. Nunca uma vivência a-histórica.
Se em outros tempos, por exemplo, as mulheres eram reconhecidas, sobretudo, pela sua capacidade reprodutiva, hoje estamos diante de um quadro em que parece uma ofensa romper a barreira do segundo filho, de modo que as novas gerações sentirão dificuldade em compreender a expressão “Igual coração de mãe: sempre cabe mais um.”
Mulher não é tudo igual. Mãe não é tudo igual! Viver a maternidade conscientemente requer tomar parte daquilo que nos constitui, tanto no âmbito pessoal como comunitário. Compreender aquilo que nos constitui não apenas para conformar-se com ele, nem para justificar-se e esconder-se, mas também para avaliar o que realmente nos edifica. Decidir sobre o tipo de mãe que queremos ser, ainda que alguns duvidem, está ao nosso alcance.
A maternidade é inevitavelmente uma via de dores e alegrias, cruz e ressurreição. O mesmo filho que nos faz rir, também nos faz chorar – quase sempre não intencionalmente – mas essa é uma via da qual dificilmente escapamos.
A via da reconciliação faz-se, portanto, também necessária. Reconciliar-se com a própria história de vida e, a partir dela, alçar novos horizontes é uma possibilidade humana que não devemos desperdiçar. Uma reconciliação que consiste em admitir falhas e erros de outros e os próprios. Da mãe que tivemos e da que somos ou seremos.
Reconciliação que significa, ainda, substituir as lentes da (auto)crítica e do (auto)julgamento, pelas lentes da gratidão e do reconhecimento, sob a pena de sermos esmagados pelo fardo da busca de uma perfeição inalcançável aos humanos.
Mesmo Aquela que muitos temos como referencial de Mãe também era única: Nossa Senhora. Podemos nos espelhar, admirar, desejar suas virtudes, mas, ainda assim, nos apropriaremos delas de maneira original e nunca da mesma forma.
Portanto, ousemos ser mais nós mesmas, com nossas fraquezas, limitações, alegrias, medos e esperanças. Ousemos amar nossos filhos com um amor livre, desinteressado, grato e feliz. Renunciemos ao fardo de acertar sempre, sendo sempre mais originais e autênticas, renunciando aos rótulos ou estereótipos. Afinal, “mãe só tem uma!”
Magna Celi Mendes da Rocha*
* Magna Rocha é Consagrada da Comunidade Católica Shalom, missão São Paulo. É doutora em Educação, Assessora Pastoral Universitária da PUC-SP, e mãe de 4 filhos.
** Artigo publicado no jornal O São Paulo, semanário da Arquidiocese de São Paulo.