Falaremos ainda sobre a queda original. Por que a serpente dirigiu-se mais à mulher do que ao homem? Por causa da natureza profunda da mulher, mais sensível ao mundo espiritual. Outra razão é uma carência da mulher com relação ao homem. O homem que não está presente nos momentos em que necessita, e isso faz com que a mulher experimente uma grande solidão. A mulher procura livrar-se dessa solidão, dessa fragilidade, dessa insegurança, tentando adquirir uma certa superioridade no nível espiritual. Creio que nós, homens e mulheres, devemos estar conscientes dessas feridas que trazemos, e que não provêm da má vontade, mas da nossa natureza. Por isso, é tão importante compreendermos e aprofundarmos essas diferenças.
Durante a última década, houve uma tentativa de negar as diferenças entre o homem e a mulher, de fazer acreditar que o homem e a mulher são a mesma coisa. Assimilamos o que nos foi dito sobre a capacidade de fazer as coisas, e creio que realmente a mulher passou no teste: tornou-se produtiva, capaz de fazer, de realizar muitas coisas. Mas a questão não é saber do que a mulher é capaz, mas qual a sua vocação própria. E isso não se situa no fazer, mas no ser. A mulher pode fazer tudo, mas o dramático é quando ela perde seu ser, não sabe mais quem é profundamente. Então, cabe-nos aprofundar essas diferenças para compreendermos como funcionam nossos mecanismos mais profundos. É verdade que depois do pecado original, tanto o homem quanto a mulher, fazem a experiência da solidão. E na união sexual, quando a mulher acaba de receber a semente do homem, ele experimenta como que uma libertação, um alívio. Mas a mulher espera ainda alguma coisa. E talvez seja necessário que o homem preste mais atenção a esse estado de espera da mulher.
Creio que o pecado do homem é o egoísmo. Vocês devem dizer: “Mas as mulheres também são egoístas”. É verdade, mas não somos egoístas da mesma maneira. A mulher tem a tendência a trazer tudo para si, a ser o centro. Mas o egoísmo do homem se manifesta mais como uma dispersão. Dispersão no fazer, no ativismo, e é facilmente visível que ele acaba sendo tomado pelo trabalho, pelas próprias obras, e esquece a ternura. O homem deve aprender da mulher a ternura, a sensibilidade às coisas interiores. É preciso estar sempre pronto a escutar.
Conseqüências do pecado original
Deus não amaldiçoou o homem nem a mulher. Mas eu diria que a punição está contida no ato. Cada pecado contém em si a sua punição, traz em si as conseqüências. Não foi Deus quem decidiu isso. Quando estamos infelizes, acusamos Deus do nosso sofrimento, mas Deus é inocente do mal. É o nosso pecado, o pecado da humanidade que nos leva a tal situação. A vontade de Deus para nós é a felicidade.
Em nossa vida somos confrontados com o mistério da cruz. Cruz é tudo aquilo que não escolhemos viver, tudo aquilo contra o que, humanamente, não podemos fazer nada; mas é também o lugar onde Deus pode e quer manifestar o poder de sua ressurreição. O que Deus nos diz através das conseqüências do pecado é que há um caminho para reencontrar a comunhão com o Pai, para reencontrar o paraíso que perdemos; esse caminho passa pelo sofrimento.
Vimos que a redenção do homem passa pelo trabalho, ou seja, o esquecimento de si mesmo em vistas da responsabilidade da manutenção de sua esposa e filhos. O cuidado e responsabilidade com a sociedade. Não sei o que acontece no Brasil, mas na Europa conheci jovens maravilhosas, magníficas, belas, inteligentes, com vida espiritual e que não encontram marido; os homens não querem mais fazer sacrifícios, assumir compromissos, fundar famílias. É importante que o homem tenha consciência da responsabilidade que lhe cabe, ele tem de aceitar essa parte de sofrimento, que vem do trabalho. Por isso, também, é tão importante lutarmos contra o desemprego, porque o homem que não trabalha não tem essa possibilidade de se realizar.
Não sei se vocês repararam, mas o pecado trouxe conseqüências mais dramáticas para nós mulheres. De um lado, temos de lutar contra a serpente, devemos travar esse combate espiritual, saber separar o bem do mal. E é imprescindível que a mulher tenha consciência de sua responsabilidade, para que não se sinta vítima com relação ao homem, mas que, revestida da força de Deus, tenha coragem de escolher o bem e denunciar o mal, e de lembrar ao homem a Lei de Deus. Muito freqüentemente as mulheres aceitam coisas que não deveriam. Por exemplo, as jovens que, por medo de não se sentirem amadas, aceitam ter relações sexuais com qualquer um. Devemos educá-las para que tenham consciência de sua dignidade.
É preciso também que as mulheres tenham coragem de afirmar e reafirmar os valores. Os valores femininos são da ordem do invisível. O mistério da mulher é como um perfume: não o vemos, mas quando o aspiramos todo nosso ser o percebe, é como que visitado por ele. É responsabilidade da mulher lembrar ao homem todos esses valores, e o faz, mais que com palavras, com a própria vida.
Outra conseqüência do pecado original para a mulher: “No sofrimento e na dor, darás a luz aos teus filhos. O teu desejo te impelirá ao teu marido e ele te dominará”. Devemos confessar que isso não é muito alegre para nós mulheres.
Podemos constatar todo um espírito de dor com relação à mulher. No entanto, tenho certeza de que o olhar de Deus para com ela é de ternura e compaixão. Existe um sofrimento no coração da mulher que só Deus pode compreender e eu diria: diante desse sofrimento da mulher o homem fica desarmado. Não queremos denegrir vocês, meus irmãos queridos, mas na realidade não foi vontade de Deus que vocês preenchessem completamente o coração das mulheres. Deus quer o primeiro lugar nele. Então, se Deus tem o primeiro lugar no nosso coração, somos um presente ainda mais maravilhoso para vocês homens. E vocês deveriam também zelar pela relação de sua esposa com Deus, e “empurrá-la” para a oração. Porque quanto mais ela mergulhar na oração, mais Deus a dará a você de uma maneira bela e nova.
Se conhecêssemos o dom de Deus, o quanto Ele deseja de bom e de belo para a relação entre homem e mulher, estaríamos cheios de alegria. Não falo de uma relação idealizada, que só existe nos romances antigos, mas de sermos capazes de enfrentar juntos o sofrimento.
O olhar
Antes da queda original, o homem e a mulher eram abençoados por Deus. Já falamos do grito de maravilhamento de Adão diante de Eva, quando Deus apresenta a mulher ao homem. Aí há três olhares: o olhar do homem sobre a mulher, o olhar da mulher sobre o homem, e o olhar de Deus sobre ambos. Creio que cada um de nós traz no seu coração a saudade desses olhares.
A mulher tem saudade desse olhar de Adão sobre Eva. Fica sempre na expectativa de um homem que olhe para ela com esse olhar de maravilhamento, e ao mesmo tempo o homem busca a mulher que suscite nele esse olhar maravilhado, e que o revelará quem ele é. Ele tem saudade e desejo do olhar maravilhado de Eva sobre ele. Creio que devemos orar pela cura do nosso olhar; e essa cura do nosso olhar uns para com os outros só pode acontecer quando nos colocamos sob o olhar do Pai. Temos necessidade de sermos olhados. Quando alguém nos ama, seu olhar nos revela esse amor. A maneira como nos olham nos diz se somos amados. E creio que Adão e Eva foram cumulados, plenificados desse olhar de Deus sobre eles. Eles podiam se amar na mais completa gratuidade. Falando no sentido estrito, eles não tinham necessidade um do outro, mas um era presente de Deus para o outro.
Do vazio à plenitude
Como conseqüência do pecado, a mulher experimentou um vazio terrível, e não tendo como receber mais essa plenitude do Pai, ela passou a esperar tudo do homem. E acabou deixando o homem desamparado, confuso porque é incapaz de preencher esse vazio no coração de Eva. E a mulher precisa aceitar, entender que existe essa falta nela, e não ficar esperando que o homem venha preencher isso, pois esse vazio é o lugar onde encontrará Deus.
A mulher deve também compreender o valor do sofrimento: através dele Deus nos desposa. Quando no nosso sofrimento nos voltamos para Deus, podemos encontrar uma felicidade profunda, porque o amor é mais forte que o sofrimento. Isso é paradoxal, mas é verdade. Não precisamos ter medo do sofrimento, porque ele é um caminho que nos conduz a Deus, e por trás do sofrimento está a ressurreição, a plenitude da presença do amor do Pai.
Quando a Palavra diz: “Você dará a luz na dor”, isso não significa apenas que teremos contrações, mas eu diria que a mulher nunca pára de dar a luz e que o trabalho de educar filhos é algo muito difícil. Educar uma criança que já está marcada pelo pecado, uma criança a quem devemos ensinar constantemente a escolher o bem e a rejeitar o mal é um trabalho doloroso. Então, o sofrimento existe com relação ao homem e com relação aos filhos.
A Palavra também diz: “O teu desejo te voltará para teu marido e ele dominará sobre ti”. Como já falei, é o vazio, a falta que a mulher sente que faz com que ela se volte e espere tudo do homem. Ela tem uma necessidade tão profunda de ser amada, que se coloca como uma serva do homem; ela mesma se expõe à dominação. Não foi Deus quem quis a dominação do homem sobre a mulher, porque isso é uma coisa má.
Para a mulher existem dois perigos: revoltar-se e recusar-se ao homem; ou entregar-se a ele de uma maneira exagerada, perdendo a própria personalidade, tendo uma atitude completamente servil. Deus quer que sejamos submissas, mas não que entremos na servidão. Ele quer que as mulheres estejam de pé na mesma altura do homem, não para lutar contra ele, mas para ser dom para ele, para amá-lo.
Uma nova comunhão
Deus nos liberta de todas as nossas escravidões. Jesus veio instaurar um novo modo de relacionamento. Ele diz, por exemplo: “Aquele que quiser ser grande entre vós, faça-se o servo de todos. Aquele que quiser ser o primeiro, torne-se escravo”. Jesus introduz uma revolução inacreditável. Temos o hábito de pensar que os grandes desse mundo devem ser servidos, mas Ele ensina o contrário. A submissão é colocar-se por baixo. Mas na verdadeira submissão cristã, o cristão coloca-se em baixo mas para elevar o outro, não para se deixar esmagar pelo outro.
Falaremos agora sobre um trecho da Palavra de Deus que foi muito mal compreendida e é muito importante para nós na aurora desse terceiro milênio, se realmente queremos encontrar uma nova comunhão entre o homem e a mulher. Da carta de São Paulo aos Efésios, as pessoas extraem apenas um trecho: “Mulheres, submetei-vos aos vossos maridos” (Ef 5,22). Vejamos esse texto de maneira integral. São Paulo vai traduzir esse novo relacionamento que Jesus veio trazer nesse versículo, quando diz antes: “Submetei-vos uns aos outros no temor de Cristo” (Ef 5,21). Tanto o homem quanto a mulher são chamados a essa submissão mútua no temor de Cristo, senão continuaremos a viver a dominação do homem sobre a mulher ou vice-versa. Porque a mulher é também tremendamente dominadora.
Freqüentemente a mulher peca por precipitação. Ela deve aprender a respeitar o caminho intelectual, o caminho da razão. E creio que alguns homens não conseguiram desenvolver-se completamente e se tornarem realmente homens e assumirem sua masculinidade porque ficaram sempre em confronto com mulheres, talvez uma mãe que quisesse fazer tudo por ele, uma esposa que não aprendeu a esperar…
Então, no relacionamento entre homem e mulher, cada um é chamado a submeter-se ao outro no temor de Cristo. Conhecemos muitas culturas, sociedades em que a mulher é oprimida, vive sob a dominação do homem, mas isso acontece porque não há temor a Deus. É preciso que homens e mulheres estejam submissos a Deus. Esse temor não é medo, mas sentimento da santidade de Deus. Ou seja, nós cristãos temos de ser responsáveis por nossos atos diante de Deus, não podemos fazer tudo o que nos dá na cabeça. E eu diria que para a mulher a questão de vencer essa dominação é entrar na submissão pelo temor de Deus. Essa é a única maneira de nos libertarmos do temor ao homem.
A libertação da mulher passa pelo coração de Deus. Não devemos ter medo de desagradar os homens. Não temos de estar dando prazer e satisfação aos homens, mas a Deus. É preciso tomarmos consciência de que somos responsáveis por nossa vida, por nossos atos. Somos livres. Precisamos reentrar na liberdade com a força de Cristo. Apenas Ele tem o poder de libertar a mulher e o homem.
A ordem divina
Essa lei nova, essa submissão deve ser ordenada. E essa submissão começa pela mulher: “Mulheres, submetei-vos aos vossos maridos”. Começa pela mulher por várias razões. Primeiramente por causa do mistério da vida que está dentro dela e que a faz mais vulnerável. Um dia estamos em plena forma, limpamos a casa do teto ao subsolo, cheias de energia; depois, estamos deprimidas, vemos tudo escuro, choramos à toa. O mero fato de conhecermos bem nosso ciclo menstrual ajuda-nos a conhecer melhor essas variações que acontecem em nós. Eu diria que por causa dessa instabilidade temos necessidade da proteção do homem. E São Paulo diz: “Maridos, cuidai de vossas esposas como pessoas frágeis” (Ef 5,25), não inferiores. Da mesma forma, por exemplo, que um vaso de cristal é mais frágil do que um vaso de barro. Dessa forma, o mistério da mulher tem necessidade de ser protegido. Podemos ver isso quando lemos o Evangelho, sempre que Deus aparece em sonho a São José, Ele diz: “Toma a mulher e a criança e vai” (Mt 2,13.20). O homem deve, pois, dispor sua força para Deus, a fim de proteger aquilo que no mundo é mais frágil e vulnerável.
Como hoje podemos suportar tantas ofensas feitas a nossas crianças? Eu diria a vocês homens: “Não aceitem todas essas situações em que nossas crianças são maliciosamente atingidas”. Por que existem tantas mulheres que abortam? Porque o homem não quer mais acolher a criança. Entre nós cristãos deveria existir uma consciência sobre a vida, a responsabilidade de proteger a mulher e a criança. Conhecemos hoje muitos jovens que querem viver juntos, mas não querem ter filhos. É preciso realmente reencontrarmos a ordem divina. Essa lei de Deus que é feita para nossa felicidade. É preciso que nos curemos das suspeitas que temos para com Deus.
“Maridos, amai vossas esposas como Jesus amou sua Igreja” (Ef 5,25). É interessante ver por que Deus mandou a mulher se submeter e mandou o homem amar. Ele não disse: “Mulher, ame seu marido”, porque amar faz parte da natureza da mulher. A mulher é amor. Eu diria que o coração da mulher só vive para amar e ser amado e João Paulo II diz que a dignidade da mulher reside na sua capacidade de dar e de receber amor. É por isso, meus irmãos, que as mulheres são tão sensíveis à falta de amor e de atenção que às vezes vocês têm. Sabemos que vocês nos amam, mas vocês devem aprender a dizer-nos isso, devem aprender a expressar o amor.
A mulher precisa ouvir todos os dias que é amada. Um pequeno gesto, um carinho, uma palavra… essas coisas alimentam o amor. Não é suficiente que se espere o anoitecer, quando se está na cama, para dizer que se ama. A união dos corpos deve ser preparada durante todo o dia pela união dos corações, pela atenção de um para com o outro. E é aí que o homem deve se converter. Não digo que é preciso que o homem aprenda a amar, porque ele ama, mas é preciso aprender a expressar o amor que sente. Também é preciso dizer que muito freqüentemente os homens são feridos pela falta de reconhecimento das mulheres, porque eles trabalham para elas e elas não conseguem compreender que esse trabalho em favor delas é, também, uma prova de amor.
Assim, também a mulher precisa converter-se com relação ao homem. Em vez de ficar chorando, olhando sempre o vazio, a falta que existe nela, a mulher deve unir-se ao seu marido mais profundamente. É o olhar da mulher que faz com que o homem seja ele mesmo. Se vocês desprezarem o homem, vão colher os maus frutos desse desprezo. Mas, se vocês colocam sobre o homem um olhar de amor, de reconhecimento, de maravilhamento diante da diferença entre vocês, vocês serão presente um para o outro. Então, a mulher deve submeter-se acreditando nesse tesouro de confiar na proteção e no discernimento do homem.
E o homem submete-se à sua esposa no mandamento do amor, sendo atento a ela. São Paulo diz: “Maridos, amai vossas mulheres como Cristo amou a Igreja. Ele se entregou por ela”. Então, a submissão do homem à mulher não significa que ela mande na casa, mas que ele tenha cuidado com a mulher como com seu próprio corpo, porque ninguém jamais odiou a própria carne, mas ao contrário, alimenta-a e cuida bem dela.
Muitas vezes a mulher é tentada a desprezar o homem. E esse desprezo é terrível, por um lado faz mal ao homem, impede que ele se torne verdadeiro homem, e por outro faz com que a mulher seja estéril. As mulheres devem ter consciência do alcance de suas palavras e de seu olhar. O homem é vulnerável diante do olhar da mulher.
Da ternura da mãe à ternura da esposa
O homem foi educado por uma mulher, sua mãe, que fez e deu tudo para ele. Então, ele tem de passar por uma prova terrível: deve deixar o amor de sua mãe, que é um amor incondicional, para enfrentar o amor de sua mulher, que é um amor exigente. Esta não está pronta a passar por tudo, a agüentar tudo como sua mãe agüentava. E, no entanto, é esta a condição para que o homem se torne verdadeiramente homem.
Deus diz: “O homem deixará seu pai e sua mãe para unir-se a sua mulher, e os dois serão uma só carne” (Gn 2,27). Creio que é importante para cada homem tomar consciência dessa passagem, dessa mudança de amor que ele tem de fazer. Por uma parte, é importante que as mães aceitem largar seus filhos no mundo e que há um momento em que é necessário cortar o cordão umbilical. Existem muitas mães possessivas. Talvez porque, frustradas no relacionamento com seu esposo, agarraram-se ao filho. É necessário que as mulheres tenham consciência de que seus filhos não lhes pertencem, mas é preciso dar, entregar seus filhos ao mundo. É igualmente importante que os homens tenham coragem de cortar esses laços para com sua mãe. Então, todo homem deve fazer essa passagem: da ternura que recebeu de sua mãe a um outro tipo de ternura de sua esposa.
Formação /2010