É verdade, eterna é a misericórdia de Deus para conosco, então eterna também é a Sua misericórdia para comigo. Sou consagrada em promessas definitivas no Carisma Shalom, como Comunidade de Aliança, por pura misericórdia de Deus.
Um texto é muito pouco para contar as misericórdias de Deus para comigo, mas sinto-me impelida a partilhar algo que vivi e que, neste tempo de Pandemia e de forte intercessão, me veio à memória.
Em um determinado ano, em que me preparei de uma maneira mais intensa para fazer as promessas definitivas, fui surpreendida por uma HSA (Hemorragia Subaracnóide). Quem é da área da saúde sabe o que é isso (não sou da área), mas posso explicar um pouco: É uma hemorragia que acontece em uma das membranas que envolve o cérebro, chamada membrana aracnoide, vazando sangue no líquido que envolve o cérebro (líquor), causada, muitas vezes, pelo rompimento de um aneurisma.
Era o ano de 2013, sábado da oitava de Páscoa, véspera do domingo da misericórdia. Na época eu estava morando sozinha, mas no quintal da minha casa tinham também outras casas e, numa delas, morava uma consagrada da aliança, que é celibatária.
Estava fazendo a faxina da minha casa e sentindo uma leve dor de cabeça e nos olhos. Essa irmã que mora no mesmo quintal perguntou se eu estava bem. Respondi que estava com essa leve mal-estar e que ia sentar um pouco e fechar os olhos para ver se passava.
Mas os meus braços começaram a formigar e as dores ficaram mais fortes, quando gritei por essa irmã, achando que estava tendo um AVC. Ela veio e, imediatamente, colocou a mão em minha cabeça e começou a orar em línguas para depois providenciar socorro – segundo ela, foi o Espírito que a conduziu. A pressão sistólica tinha chegado a mais 240 mmHg.
Imaginei que ficaria alguns dias no hospital e, depois de estabilizada a situação voltaria logo para casa. Quando dei entrada na emergência e soube que iria para a UTI, levei um susto, não imaginava a gravidade do caso. Fiquei 19 dias na UTI, sem receber a comunhão diariamente e sem um símbolo cristão no local em que eu me encontrava. Além disso, na TV não pegava a rede Vida, único canal católico em TV aberta na época, onde nem a missa pela TV podia acompanhar.
Recebi a comunhão apenas duas vezes, nos domingos. Recebi também a unção dos enfermos duas vezes, no início da minha internação e mais para o final e como foi importante! Não tive acesso à missa e à Eucaristia, mas Jesus se fez presente por sua Palavra, através da liturgia diária e das Laudes que, com a graça de Deus eu fazia diariamente. Me acompanhou também pela força da intercessão dos irmãos e dos irmãos que se fizeram presentes no hospital.
Foram dias em que pude experimentar a força da Palavra, a sede pela Eucaristia, pela vida comunitária, como também fazer uma boa revisão de vida. Tem males que acontecem em nossa vida que são como uma espécie de morrer para nascer de novo.
“Meu coração está pronto, meu Deus, está pronto o meu coração.” (Sl 56)
Em um dos dias em que rezava as Laudes tinha aquele Salmo que diz: “meu coração está pronto, meu Deus…” eu comecei a rezar com esse salmo e dizia ao Senhor: “Não está pronto, não, Senhor!” Comecei a olhar para a minha vida, as minhas inconsistências vocacionais, as incoerências, perdão a ser dado e a ser pedido…
Não estava pronta e pedi a Deus mais um tempo, eu não queria ir naquele estado em que me encontrava.
Foi uma experiência de revisão de vida e de arrependimento profundo. Uma experiência que hoje peço a cada um que está em seu leito de hospital. E como faz falta uma cruz no quarto do hospital para poder olhar para ela, uma imagem de Nossa Senhora para poder olhar e saber que a Mãe está ali. Como faz falta!
Para um enfermo cristão, o acesso a esses sinais são um pequeno consolo. Alguém que reze o terço com você, pois você não tem forças para rezá-lo sozinha, acaba dormindo por causa dos remédios. Aproveito e agradeço a cada um que esteve presente comigo no hospital naqueles dias, a cada irmão que de longe, muitos que, mesmo sem me conhecer, rezaram por mim.
Outra coisa que experimentei foi o poder da intercessão. Expresso a minha gratidão a você, caro irmão, que mesmo sem me conhecer rezou por mim. A cada irmão e amigo que rezou e mobilizou outros irmãos a rezarem por mim. O Senhor me fez lembrar o quanto a intercessão dos irmãos foi importante naquele tempo.
Recebemos nos grupos vários pedidos de oração, confesso que, nem sempre dava tanta atenção. Mas o Senhor me fez recordar do que passei e da oração dos irmãos, o Senhor despertou-me a interceder com mais intensidade, tanto que conforme vão aparecendo os pedidos de oração vou anotando os nomes em uma folha de papel que deixei separada para isso e rezo a cada terço, a cada missa, por essas pessoas.
Saí do hospital no dia de São Marcos (25/04).
Sei das datas por causa das Laudes e da liturgia diária que me acompanharam no hospital. Pelas Laudes, me colocava em comunhão com a oração da Igreja, já que não tinha missa.
No período de recuperação, na casa do meu irmão, foi providenciado que eu recebesse a Eucaristia diária. E, com a graça de Deus, em Junho ou Julho, fui voltando à vida social e comunitária.
Fiz minhas promessas definitivas no ano seguinte, por pura misericórdia de Deus, e posso cantar com o salmista:
“A mão direita do Senhor fez maravilhas,
a mão direita do Senhor me levantou,
a mão direita do Senhor fez maravilhas!
Não morrerei, mas ao contrário viverei
para cantar as grandes obras do Senhor!
Dai graças ao Senhor, porque Ele é bom!
Eterna é a Sua misericórdia!” (Sl 117/118)
Rita Kodama | Consagrada na Comunidade de Aliança no Shalom de Santo Amaro