O que é a raiva? É uma importante fonte de energia. Não é boa nem má (não é uma realidade moral, é uma realidade factual). Devo ser capaz de admitir que estou com medo, com raiva ou excitado sexualmente. Cabe a mim decidir se devo ou não devo agir conforme minhas emoções (eis o papel da vontade). Assim, o que se deve fazer com as emoções? Não reprimi-las, reconhecê-las, decidir se iremos ou não agir a partir delas. Não é o comportamento de outra pessoa que vai manipular o seu. Por quê? Ora bolas, porque você é livre!
As pessoas reativas não são livres, mas estão atreladas ao comportamento dos outros. Você não é reflexo dos outros, nem sombra das outras pessoas. Ou está sendo? É preciso amar-se para amar: “Ama o teu próximo como a ti mesmo”. Quem não se ama, nem se estima, não amará os outros, nem estimará os outros. As três faculdades – intelecto, vontade e sentimentos – devem ser integrados. Integrar as faculdades significa harmonizá-las para ajudar o indivíduo a evoluir como pessoa madura. Reconhecer os sentimentos é fundamental. Daí, é bom responder a uma perguntinha básica: o que estou sentindo? E integrá-los com essa outra perguntinha estratégica: devo agir conforme este sentimento ou não?
Nossa vida é como uma carroça puxada por um cavalo. A vontade é o cocheiro. A inteligência, o viajante passageiro. O cavalo representa as emoções. A vontade deve guiar o cavalo das emoções, e a inteligência deve iluminar a vontade para que saiba fazê-lo. Matar o cavalo é burrice. Reprimir as emoções, também. O que fazer com as emoções, então? Guiá-las. Não deixar-se guiar por elas. E qual o problema em ser guiadas por elas? Elas são cegas. São impulsivas e sem discernimento. Aliás, não é papel delas discernir nada. Assim sendo, cabe à vontade dar um rumo às coisas, e à inteligência dar uma luz no processo de decisão e condução das coisas.
Escolher a si mesmo não é egoísmo: é escolher-se no que é melhor, no que faz bem, no que nos leva a Deus. Escolhe-te escolhendo o que Deus escolheu. Escolhe com inteligência, direciona tuas vontades neste caminho inteligente e usa tuas emoções para tudo acontecer nos conformes de uma harmonia que te levará à liberdade e à felicidade. Acho interessante o que o staretz* Ambrósio ensinava: “Como viver?”. Ele respondia no seu habitual tom humorístico: “Viva — não se apoquente, não julgue ninguém, não irrite ninguém e meus respeitos para todos”. Com frequência, o tom do staretz produzia sorrisos nos ouvintes frívolos. Porém, se se prestasse atenção nas instruções, o significado profundo delas se tornaria aparente. “Não se apoquente,” isto é, que seu coração não se ocupe com pesares e aflições que são inevitáveis para o ser humano, mas que, ao contrário, ele se dirija para a fonte única de alegria: Deus. Com Ele, uma pessoa é reconciliada com seus pesares, torna-se “submissa”, obtendo, assim, tranquilidade.
“Não julgue ninguém,” “não irrite ninguém.” Julgar e irritar, que são os rebentos do orgulho destrutivo, são as duas atividades mais comuns entre as pessoas. Elas são sufi cientes para dirigir a alma de alguém para as profundezas do inferno, mesmo que a maioria pense superficialmente que estas coisas não são pecado. “…Tende paz com todos os homens”, diz o apóstolo em sua diretiva (cf. Rm 12,18). Juntando todos estes pensamentos em um só, poderemos ver que o staretz estava pregando principalmente a humildade — a base de toda a vida espiritual, a fonte de toda bondade, sem a qual ninguém pode ser salvo.
O staretz transmitiu outra narrativa instrutiva: “Um demônio com aparência humana estava sentado balançando os pés”. Vendo-o com seus olhos espirituais, o staretz lhe perguntou: “‘Porque tu não estás fazendo algo?’ O demônio respondeu: ‘Bem, eu não tenho outra coisa para fazer além de balançar meus pés, porque as pessoas estão fazendo tudo muito melhor do que eu’”.
E, por fim, outro ensinamento do abade staretz Ambrósio: “O amor engloba tudo. E, aquele que é benevolente para com seu próximo — através da inclinação do seu coração, e não movido por obrigação ou desejo — o diabo é incapaz de interferir com ele. O amor, seguramente, é mais elevado que tudo. Se descobrires que não há amor dentro de ti, mas quiserdes obtê-lo, pratique então atos de amor, mesmo que no começo sem amor. Deus verá teu desejo e sofrimento e implantará amor em teu coração. Aqueles que têm um coração feio não devem se desesperar, porque com a ajuda de Deus é possível reformá-lo. Tudo que tens a fazer é se observar atentamente, não dar oportunidade para que um benefício ao próximo escape. Abra teus pensamentos para o teu staretz e sede benevolente ao máximo. Por certo, isto não pode ser feito de repente, mas Deus é muito paciente. Ele só termina a vida de uma pessoa quando Ele vê que ela está pronta para cruzar para a eternidade, ou quando vê que não há esperança de melhoria para ela”.
* Staretz é um ancião experiente que guia espiritualmente os mais jovens.