Diante de um tema como este, imaginamos logo que o homem, para se tornar plenamente realizado, totalmente satisfeito consegue mesmo, precisa de condições intrínsecas e extrínsecas. Não só o que está dentro dele, mas também o que está fora. Importante é também lembrar que o homem já tem em si atributos que lhe são próprios e através dos quais sua humanidade é identificada e reconhecida.
Poderíamos então perguntar: quem é o homem? A resposta vem quase automaticamente aos nossos lábios, quer pela formação intelectiva, quer pela formação bíblica. Mas em linhas bem simples, sem deixar de ser profundas, pode-se definir: O homem é um ser bio-psico-sócio-espiritual, que foi criado para servir, amar e louvar a Deus.
Assim sendo, é preciso que o dimensionemos em todos os seus aspectos. Para falarmos um pouco, e de modo mais prático e concretamente, do homem que busca sua plenitude, é importante classificarmos alguns aspectos do que chamamos ou conhecemos como plenitude. O homem que se vê por inteiro, que busca se erguer ressuscitando não só na sua espiritualidade, mas consciente de que é um ser como um todo e constitui a imagem e semelhança de Deus. Desse modo, a hipertrofia de uma área, qualquer que seja ela, resulta em desequilíbrio e, conseqüentemente, impedimento para atingir a plenitude.
É por isso mesmo que o homem tem de intuir e fazer valer, para si e para os outros, que sua santificação implica num processo de aperfeiçoamento crescente, que decorre de uma ascese para o seu corpo, para o seu intelecto, para a sua vida relacional, para sua espiritualidade. Não é possível ser santo de pedaço! Não é possível ser santo sem envolver sua vocação, seu estado de vida, sua profissão. Um padre será tanto mais santo, quanto mais ele santificar seu sacerdócio, mas também seus relacionamentos, seu corpo, seu intelecto. Uma mãe de família será santificada se assim o buscar no seu lar, com o esposo e os filhos, amando-os e servindo-os, mas também santificando seu corpo, na alimentação moderada, na vestimenta sóbria, nos costumes, nos hábitos, no lazer, na linguagem; e coroando pela vivência espiritual, passando para seus filhos o que Deus lhe falou e a fez viver. Um celibatário não encontra sua santidade apenas pela escolha do estado de vida. É preciso que santifique sua continência através de um corpo casto, de relacionamentos puros, de vivência santa na sua espiritualidade. É preciso que o ser todo do homem seja santo.
O Trabalho
Poderíamos enumerar uma lista de necessidades do homem, mas nos restringiremos às duas mais essenciais, que se relacionam às razões de sua própria existência. Iniciemos pelo trabalho. Sim, o homem foi criado para servir a Deus. Ele não pode deixar de ser caracterizado como um ser que, como diz João Paulo II, em sua encíclica Laborem Exercens, “se distingue das demais criaturas pela capacidade que tem para o trabalho e somente o homem o realiza preenchendo ao mesmo tempo com ele a sua existência sobre a terra”. Sem o trabalho o homem perde o sentido da sua vida, uma vez que é pelo trabalho que ele se descobre vencendo a terra, dominando-a, para dela tirar a própria subsistência.
O trabalho está intrinsecamente relacionado ao sentido da vida. Algumas pessoas deficientes e com limite de vida encontram não só o gosto de viver, mas também conseguem prolongar sua vida realizando um ato, criando um trabalho.
Uma jovem portadora de uma doença crônica incapacitante disse-me certa vez: “Eu preciso trabalhar, pois cada vez que vejo o produto do meu trabalho nas mãos de alguém, é como se eu escutasse de mim mesma: “Veja, você está viva!”
E o Santo Padre diz: “O trabalho é um bem do homem porque, mediante o trabalho, o homem não somente transforma a natureza, adaptando-a às suas próprias necessidades, mas se realiza a si mesmo como homem, e, em certo sentido, se torna mais homem”.
Amar e ser amado
A outra necessidade do homem está relacionada à sua afetividade; se o trabalho o distingue das demais criaturas, o amor não só o distingue, como o diviniza, uma vez que sendo Deus Amor, é através da profundidade deste sentimento que o homem torna-se em vivência o que em sua essência foi criado: aberto a amar e ser amado; a imitar a Deus, a viver em Deus, a sentir-se em Deus.
É pelo amor que o homem, conhecendo-se a si mesmo, rejeita tudo o que venha macular sua imagem e semelhança de Deus. O santo temor de Deus é, portanto, o não querer deixar de ser amor. Mas mesmo saindo da visão transcendente do amor, que torna o homem mais unido a Deus, o homem também necessita experimentar o amor humano como condição “sine que non”* para dar sentido à sua existência. O homem que não ama alguém ou não se sente amado por alguém não só não cresce no autoconhecimento como ainda entedia-se na repetição de atos, porque o dar-se somente a si mesmo é por demais insuficiente para satisfazer suas necessidades de amar. Centralizado em si mesmo, tudo se torna extremamente vazio. Às vezes as pessoas pensam que o celibatário, o sacerdote e a religiosa não amam. Como estão enganados! Amam e amam profundamente, sem ciúme, sem egoísmo, sem espera de retorno, sem medir o que dão.
O amor humano tem como referencial o amor do próprio Deus, mas Deus também, em sua profunda humildade, se utiliza das imagens do amor humano materno para nos fazer entender o seu amor (cf. Is 49,15).
Precisamos mais do que nunca reavaliar a nossa capacidade de amar! Nunca o mundo comportou tanta depressão como hoje. Nunca o mundo viveu um individualismo tão profundo como o que agora se verifica, em todas as camadas sociais. O culto ao “eu” não deixa de ser um culto ao desamor.