Naquele dia, quebrei o costume e cheguei mais cedo para a Missa. Fiquei parada na escadinha do centro de evangelização, observando todo aquele movimento das cinco e meia da tarde. Algumas pessoas chegavam para a missa, outras saíam animadas dos grupos de oração, um padre ouvia confissão um pouco preocupado com a fila que não parava de crescer, o pessoal do ministério de cura e aconselhamento recolhia as cadeirinhas dispostas duas a duas naquela conhecida posição, umas senhoras rezavam o terço na grutinha e os meninos da liturgia passavam de um lado para o outro, agitados e com aquele eterno ar de preocupação e zelo.
Fiquei feliz com o que vi e imaginei o que de tão especial havia naquele lugar. Não me parecia ser a estrutura ou as pessoas. Apesar da reforma recente, as paredes descascavam e as pessoas não aparentavam ser tão divertidas, interessantes ou bonitas… O que tornava aquele movimentado lugar tão diferente não podia ser o que eu conseguia ver.
Fechei os olhos e rezei por um instante… Ao que parecia, naquele lugar uma graça diferente reinava. Por ali, pairava uma benção, um dom de Deus, sei lá… Um Carisma, talvez. Não sei dizer perfeitamente o que é um Carisma, mas na hora me lembrei do Moysés Azevedo ensinando que um dom como esse brota do coração de Deus e se manifesta no homem. Em um lampejo, minha imaginação começou a fervilhar e eu imaginei como em um desenho animado o carisma brotando do coração de Deus, como uma luz brilhante, poderosa e intensa, rodando todo o mundo com seu potencial de realizar grandes coisas e findando por concentrar-se com toda a força na pequeníssima cidade de Fortaleza, no coração daqueles homens, para, só com eles, por meio do transbordamento, realizar tudo o que eu podia ver.
As palavras do Moysés vieram mais uma vez à minha cabeça, “(…) aconteceu algo de interessante em nosso meio. Por graça de Deus, o Shalom se tornou uma fonte de bênçãos divinas, uma manifestação muito visível do seu amor”. Parecia que ele estava vendo o que eu via. Todo aquele movimento de anúncio do Evangelho, distribuição dos sacramentos, adoração de Jesus Eucarístico e trabalho pelo Reino tinha um poderoso dínamo, uma graça especial, uma força!
Era isso que eu via, “uma manifestação visível do amor de Deus”, em conjunto e individualmente, em cada rosto preocupado, cansado e atarefado que passava pelas escadas. Eu olhava o que chamamos de “Obra”, mas a verdadeira obra acontecia no coração daquelas pessoas. O grande e invisível amor de Deus acontecia em cada um e podia transbordar para que eu também pudesse tocá-Lo! Percebi que a estrutura, o trabalho mecanizado e até os grandes eventos (que são incríveis) eram só o derramar da verdadeira obra e que Deus aperfeiçoava corações à santidade para que tudo pudesse se realizar.
Agradeci a Deus por estar ali presenciando o verdadeiro e belo amor acontecer, afinal, eu poderia ainda estar buscando assisti-lo no cinema. O amor livre de sentimentalismo, encarnado, fruto do sim de cada dia, dado na graça, nascido nos sacrifícios, na obediência, no despojamento e no cotidiano de santidade era bonito de ver. Era uma prova da bela, imensa e silenciosa obra de Deus realizada de forma particular e em tudo o que eu via.
Pensei que era muita sorte a minha poder pisar num lugar como aquele que, apesar de não ser uma “Assis” (um lugar de santos gigantes e de milagres fantásticos,) tinha um valor imenso e muitíssimo especial galgado na diminuta entrega de vida de pequenos, porém valiosos vasos de argila que, provavelmente, em muito alegram, em suas imperfeições, o coração de Deus. Era mesmo uma grande sorte presenciar tudo aquilo, ou melhor, era mesmo um grande e precioso presente.
Marília Bitencourt C. Calou