Sempre que paramos para refletir sobre o perdão – este tema que volta e meia vem bater a nossa porta para “incomodar” nossos ouvidos – nos constrangemos, pois eventualmente temos uma pendência irresoluta com ele, seja a de perdoar ou a de nos sentir perdoados por si e ou pelos outros. Invariavelmente, tal tema é sempre lembrado com particular insistência porque precisamos dele para vivermos livres e liberais.
Sim, é preciso ser liberal com todos, inclusive consigo mesmo. Pois quando se é liberal, todas as vias do perdão se abrem e consequentemente os cárceres também, os que aprisionamos o outro e os que nos aprisionam. A liberdade interior depende de uma livre decisão em liberar o outro de toda e qualquer dependência do seu perdão para serem livres como quando Deus o criou, e isso sempre incluirá nós mesmos.
Somos aprisionados por nós mesmos sempre que nos impedimos a livre passagem da misericórdia de Deus por dentro de nós, acorrentando nossos próprios pés e mãos, o que nos impede de caminhar livremente e de estendermos as mãos aos que precisam delas. Nós perdemos muito com isso e os outros, que nada têm a ver, também.
Imperfeitos muito amados por Deus
Passamos a nos enxergar de modo depreciativo, o que nos impede de nos sentir amados pelos outros, não porque nos veem de modo depreciativo, mas porque impedimos, deliberadamente, o outro de nos alcançar, ainda que ele queira e até tente. Esta forma de nos vermos como desmerecedores do amor do homem – que vem do amor de Deus – muitas vezes está atrelada à negação de um perdão que já conquistamos de Deus de forma gratuita e só mudaremos este olhar quando acolhermos o perdão, nos reconhecendo como imperfeitos muito amados por Deus e plenificados por Ele com seu amor de cruz.
Este amor que pega nossas dores e as converte em amor. E é, tantas vezes, a dor a precursora deste amor tão desejado! Por isso, não tenhamos medo de sentir dor, nem do sofrimento que a gera, pois o milagre aí está. Mas também não cavemos sofrimentos nem dores geradas pela autocomiseração, pois se nascem de intentos fundados no vitimalismo, não têm potencialidade para gerar frutos viáveis. E Jesus deseja tão logo provar dos frutos que espera por nos ter plantado em sua vinha.
E, na parábola do servo impiedoso, Ele relata que o empregado arrependido e recém perdoado não usou de misericórdia com seu companheiro devedor. Logo ele, que fora poupado de uma pena tão grande que restringiria não somente a liberdade dele, mas a de seus familiares também, não foi capaz de perdoar uma dívida de apenas cem moedas! E nós quantas vezes aprisionamos nossos companheiros por falta de perdão?
“Ok, te perdoo”
E quantas vezes dizemos “Ok, te perdoo”, mas perversamente encarceramos alguém num sentimento de vingança até que ele pague por tudo que fez, nos assentando à mesa e aguardando, pacientemente, para nos banquetear do prato que se come frio. Cruel de nós que, sabendo que depende exclusivamente de nós liberá-lo para ser aquilo que Deus o criou para ser, decidimos mantê-lo cativo!
Mais triste ainda é quando pensamos que isso não nos atinge. Amarga ilusão, pois o empregado perverso, por sua vez, será submetido a penas ainda maiores até que pague sua dívida também.
Contudo, temos hoje ainda a livre escolha de usar abundantemente de compaixão e perdoar de coração os nossos devedores, pois mais devedores fomos nós, que um dia precisamos que Deus se fizesse carne e derramasse seu precioso sangue para nos libertar do cárcere eterno que nos esperava. Quem nós julgamos ser para tentarmos, a qualquer custo, assinar um processo já revogado pelo próprio Juiz?
“É ele que nos perdoou todos os pecados, cancelando o documento escrito contra nós, cujas prescrições nos condenavam. Aboliu-o definitivamente, ao encravá-lo na cruz” (Cl 2,13.14).
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Manual para uma boa Confissão, de Padre Antônio Furtado
Dica de leitura
O livro Como Perdoar de Ana Paula Gomes trata o tema do perdão em profundidade. Testemunhos, ensinamentos e dicas para perdoar a quem causou feridas no coração ou mesmo para perdoar a si mesmo por causa de erros cometidos, mas nunca esquecidos.
Como perdoar– Ana Paula Gomes Bastos
128 páginas – Edições Shalom
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Por Laura Machado