Quero ser trigo morto e pisado, silenciosamente depositado na vida cotidiana, que de tão simples e repetitiva corre o risco de ter seu brilho e beleza ofuscados pela minha pressa de cada dia.
Quero ser o sal que dá sabor e alegria aos dias que de tão comuns e exaustivos chegam a ser martírio.
Quero ser luz para, no coração de um mundo em trevas, iluminar a face de Cristo, ofuscada por tantos enganos e ilusões, tão encoberta por tantos outros rostos, que quase sempre nada têm a dizer sobre o sentido de tudo isso.
Quero semear a eternidade em cada segundo do tempo para que, em meio às coisas que passam, experimente já aqui o doce sabor da “incorruptibilidade de Cristo”, que me mostra o que de fato esta vida é: “um instante entre duas eternidades”.
Não quero mosteiros, nem celas, nem hábitos, porque Tu assim não o quiseste e eu desejo amar o que Tu queres.
Quero verter minha vida por entre as ruas agitadas dessa cidade, por entre tantos rostos e corações marcados pela dor e que passam por mim, na universidade, no trabalho, no ônibus, onde quer que Tu me envies. Muitas vezes, não sei quem eles são, mas Tu o sabes e é por eles que estou aqui.
Quero exalar o perfume do Teu amor, com uma vida que fale mais de Ti do que de mim. Quero, numa escolha radical, exclusiva e apaixonada por Ti e pelos Teus, ser uma seta que aponta o Céu e que eloquentemente, incomodamente, diz: “Vede! Ainda não é aqui! Vede! Está para além aquilo que tão desesperadamente buscais, ‘entre os mortos’! É Cristo que buscais, eu o vi Ressuscitado e Ele está em mim! Shalom! Recebe a Paz!”
Quero ser presença transformante deste Cristo! Quero ser um lado aberto, que mesmo sendo chaga é amor, que mesmo tendo sido aberto como sinal de morte, hoje é lugar de experiência com a Vida Plena para os que, amargurados pela solidão de uma vida absurda, já não conseguem crer em mais nada, como eu um dia.
Em um mundo farto de saciedades tão efêmeras quanto mortais, quero com minha vida dizer que aqui toda satisfação é provisória e que o único amor pelo qual vale a pena tudo perder é aquele que “vale mais do que a própria vida”. Tudo o que grita em nós, em cada fibra do nosso corpo, um só nome clama: Deus!
Quero, unido a Ti, ser um canto de amor que abrande as dores do mundo. Canção que canta a Tua melodia, que é Presença, Sustento, Esperança e Sentido. Canção que enamora o homem da Tua Misericórdia, que apaixona o coração ansioso pela Beleza, pelo Bem e pela Verdade que só Tu És.
Embora aspire ao Céu, o meu coração também é feito do barro desta terra…
Então, em cada luta, em cada prova e solidão, quando me sentir débil demais para dar um passo que seja, quando acreditar me for tão custoso quanto viver e quando o “sim” tiver o gosto amargo de tantas possibilidades sacrificadas por amor a Ti e ao Teu Reino, aí quero poder fechar os olhos e, em um profundo suspiro, sentindo nele toda a transitoriedade desse fôlego que aqui me destes, dizer como Pedro, apaixonado e vacilante: “A quem irei Senhor, se só Tu tens palavras de Vida Eterna”. Pois eu bem sei que “minha vida é um brevíssimo segundo, um instante que passa e já foge. Para te amar aqui meu Deus, só tenho hoje!”
Danillo Pereira
missionário da Comunidade de Aliança Shalom em Aracaju (SE)
