São João Paulo II ao tratar sobre o amor humano, matrimônio e família trouxe um riquíssimo magistério propondo uma amplitude de horizontes. Neste sentido, arrematou a íntima conexão entre a missão da Igreja e a família, registrando que “A coisa mais fundamental e mais importante na missão da Igreja é a renovação espiritual da família… Deve-se começar deste ponto, desta missão. Igreja Santa de Deus, tu não podes fazer a tua missão, não podes cumprir a tua missão no mundo, senão através da família e da sua missão”[1]
No decorrer da vida, todos nós recebemos uma missão pessoal, a qual está unida à vontade de Deus. Esta fabulosa descoberta, se dá no seio familiar e encontra seu ápice na analogia entre família e comunhão intra-trinitaria[2] e na metáfora patrística da família como “pequena igreja doméstica”[3]
No matrimônio, esta missão consiste claramente em erguer um santuário para Deus. Assim, urge aprofundar ainda mais o tema da vocação e missão da família na Igreja, considerando-se que a vivência sadia e fecunda da família reflete em toda a humanidade.
Ora, as mudanças antropológico-culturais verificadas na sociedade interferem diretamente sobre todos os aspectos da vida, o que exige uma abordagem analítica e diversificada que considera “o perigo crescente representado por um individualismo exasperado que desnatura os vínculos familiares e acaba por considerar cada componente da família como uma ilha”[4]. Uma das consequências disso, cada dia mais evidente, é o ente familiar centralizar-se em si e em seus próprios desejos como se fossem absolutos, impedindo as relações de gratuidade nos vínculos familiares.
Neste cenário, é de relevo a dimensão afetiva, de modo que o desafio da Igreja consiste em “ajudar os casais no amadurecimento da dimensão emocional e no desenvolvimento afetivo, através da promoção do diálogo, da virtude e da confiança no amor misericordioso de Deus”[5]. E face de tamanho desafio, exige-se uma intensa luta contra as tendências culturais que têm levado as famílias a uma afetividade destacadamente ferida e, sobretudo volúvel. É exatamente nesse contexto que a Igreja, como mãe, é chamada a anunciar a verdade e a esperança para reforçar os valores do matrimônio e da família cristã.
No ambiente cultural moderno, onde se torna cada vez mais comum a dissociação entre matrimônio e família, a Igreja avigora o tema do matrimônio indissolúvel: “Portanto, não separe o homem o que Deus uniu” (Mt 19,6). Ora, o próprio Jesus mostrou o valor da família ao vir ao mundo por meio de um núcleo familiar (Lc 1,26) e nele dar início à sua missão (Jo 2,1-11).
Nos desígnios divinos, a família tem um fundamental papel, marcadamente nos primeiros momentos da criação, em Adão e Eva (Gn 1,27) e ao receberem do Criador a missão de serem fecundos e se multiplicarem (Gn 1,28). Deus nos ensina, então, que “o homem deixará o seu pai e a sua mãe para se unir à sua mulher; e já serão uma só carne” (Gn 2,24). Aqui, já se nota o quanto Deus quis se utilizar desta “célula” para realizar sua obra salvífica.
O Concílio Vaticano II, assentando a grande preocupação da Igreja com a realidade do matrimônio lança a Constituição Dogmática Gaudium et Spes com um capítulo especial voltado às questões matrimoniais e familiares. Este, porém, não é o único documento que trata do assunto, há também a Humanae Vitae, a Exortação Apostólica Familiaris Consortio, a Encíclica do Papa Bento XVI Deus Caritas Est e muitos outros, visto que o assunto não se esgota, em face das constantes mudanças na sociedade.
Concretamente, a Igreja tem avançado na discussão do tema propondo a permanência das famílias nos valores do Evangelho, seguindo o olhar de Cristo. Aos jovens, cada vez mais confusos quanto ao tema do matrimônio, incentiva-se para não hesitarem em acolher a riqueza deste sacramento, repleto do amor e da graça de Cristo.
Assim, do ponto de vista pastoral, “O anúncio do Evangelho da família em seus diversos contextos; o compromisso da parte de toda a comunidade cristã, em preparar bem os nubentes para o matrimônio, recordando-os da importância das virtudes; acompanhar os primeiros anos da vida matrimonial; cuidar daqueles que vivem o matrimônio civil e/ou convivem, promovendo o matrimônio cristão; cuidar das famílias feridas, dentre outros”[6].
Uma família bem formada e acompanhada na fé, certamente viverá sua missão no mundo, sendo templo do Espírito, casa de Deus, “Sal da Terra e Luz do Mundo” (Mt 5,13-14).
Paulo César Gomes Albuquerque*
Comunidade de Aliança – Shalom
[1] JOAO PAULO II, Omelia alla S. Messa per le famiglie neo-catecumenali inpartenza per le missioni, Porto San Giorgio, 30 dicembre 1988
[2] Referencia abordada pela Const. Past. Gaudium et Spes, n. 24
[3] Const. Dogmática Lumen Gentium, n. 11; Decreto Apostolicam Actuositatem, n. 11
[4] A vocação e a missão da família na Igreja e no mundo contemporâneo, n. 5, in https://www.vatican.va/roman_curia/synod/documents/rc_synod_doc_20141209_lineamenta-xiv-assembly_po.html
[5] A vocação e a missão da família na Igreja e no mundo contemporâneo, n. 9
[6] A vocação e a missão da família na Igreja e no mundo contemporâneo, n. 29-61
* O autor está em fase de conclusão do curso de especialização em Família, promovido pela FATEO (Faculdade de Teologia de Brasília) em parceria com o Pontifício Instituto Teológico João Paulo II – Matrimônio e Família
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