Por ter também um caráter humano, as Escrituras não estão desligadas de tudo o que nós podemos estar vivendo, seja alegria, tristeza, ódio, vingança, conquista, amor, aventura, pecado, virtude, etc. A realidade da doença, logicamente, não está ausente, nem muito menos a doença da qual queremos tratar hoje: a depressão.
Ao tratar desta doença corremos o risco de crer que a Bíblia não pode conter nada a respeito, muito menos em se tratando de uma doença tão comum hoje, tanto assim que poderíamos pensar que nem existia antes. Pois bem, certamente, a doença como é especificada pela ciência hoje talvez seja difícil de encontrar, mas certamente muitas personagens bíblicas sofreram-na ou tiveram momentos de intensa pena, dor, angústia, sofrimento. Sintomas, muito deles, associados aos que hoje se denomina depressão.
A figura de Nosso Senhor Jesus Cristo
Proponho começar de uma forma diferente. Falemos em primeiro lugar de Nosso Senhor Jesus Cristo. Limitemo-nos ao seu padecimento na sua paixão. Certamente foi o momento da sua glória, da sua inteireza divina e humana, momento de redenção. Mas, como tanto nos encoraja Santa Teresa, pensemos na Sua humanidade. Que podem significar as palavras de Mateus (26, 37ss) quando diz: “e tomando a Pedro e a dois dos filhos de Zebedeus (Jesus) começou a angustiar-se”.
Notemos neste versículo que usa-se o verbo lupéo (angustiar-se, ficar triste, sofrer, afligir-se). No próximo versículo ainda dá ênfase a tal sentimento: “lhes disse: ‘muito triste está a minha alma até a morte’”. Usa-se no texto grego perilupós, ou seja, uma palavra derivada da anterior lupéo, só que com o sufixo peri, dando com isso mais ênfase ainda. O que poderíamos traduzir como muito triste, súper-triste, hiper-triste, mega-triste, ou numa linguagem mais coloquial “triste demais, triste que só”, etc., significando uma profunda tristeza! uma tristeza indescritível! E ainda mais o evangelista quis marcar o sentimento dizendo: até a morte.
Demos mais um passo, ainda na narração da paixão de Mateus, quando por três vezes Jesus pede ao Pai para afastar, se for possível, esse cálice, referindo-se com isso a todo o que estava por vir. Três vezes ele pede ao Pai! Tamanho era o sentimento de angústia e tristeza (ver. Mt 26, 36-46; Mc14,32-42;Lc,40-46).
“Meu Deus, por que me abandonastes?”
Finalmente, antes de passar a outros personagens, pensemos na frase que Jesus grita na cruz, quando sente que está morrendo de fato: “meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste? (Mt 27,46). Pensemos em Jesus, filho de Deus, Deus mesmo, se encarnou, fez o bem a tantos, curou cegos, devolveu a vista, ressuscitou mortos, ensinou e no final da vida foi abandonado pelos seus, batido, golpeado, ultrajado, pisoteado, cuspido, considerado um blasfemo, um impostor, condenado à pior das mortes, morte de cruz… Certamente Jesus assumiu muito de nossa condição.
Poderíamos falar de muitas outras personagens, como Jó, que perdeu familiares, bens e até a saúde (Jó 1,13-22. 2,1-13), e como no seu livro se expõe poesia sobre a dor, a angústia e o sofrimento humano, algo que poderia ser descrito hoje como sintomas de depressão. Também poderíamos falar de Davi, no momento em que é descoberto no pecado de adultério e assassinato (2Sm 12,1-10). Ele expõe também de forma poética belos versos se descobrindo a si mesmo como um que “nasceu na iniquidade” (Sl 51,7).
Aceitação de Jonas
Outro exemplo poderia ser Jonas. Deus lhe encarrega anunciar a destruição de Nínive. Ele não quer pregar e foge para longe. Mesmo assim, depois de algumas peripécias, ele vai pregar. O povo escuta a pregação e se converte a Deus e são perdoados por Ele. Então o profeta fica zangado com Deus por ousar misericórdia. Isso desagrada a Jonas que diz:
“Ah! Senhor! Não foi esta a minha palavra, estando ainda na minha terra? Por isso é que me preveni, fugindo para Társis, pois sabia que és Deus compassivo e misericordioso, longânimo e grande em benignidade, e que te arrependes do mal. Peço-te, pois, ó Senhor, tira-me a vida, porque melhor me é morrer do que viver.”
Ele entra num estado tal que pede para morrer. Ele vai se sentar e fica dormido. Deus faz crescer uma planta para lhe cobrir do sol. Depois a planta morre por um verme. O sol dá na cabeça de Jonas. Ele se irrita de novo e pede para morrer: “o sol feriu a cabeça de Jonas; e ele desmaiou, e desejou com toda a sua alma morrer, dizendo: Melhor me é morrer do que viver.”
Obviamente há um ensino teológico por trás da história de Jonas, mas cabe aqui ressaltar como o texto bíblico apresenta personagens que não estão nada longe dos nossos sofrimentos de hoje.
A força vem pela Palavra de Deus
Encerramos este artigo falando do Salmo 88. Ao nosso ver ele expressa plenamente o que vive uma pessoa que passa por depressão: “Sou infeliz e moribundo desde a infância”, “tu afastas de mim meus parentes e amigos, as trevas são a minha companhia”, “minha vida está cheia de males”.
Não em vão a Igreja reza sempre este salmo na liturgia das horas, nas Completas, na sexta a noite, depois de uma semana desgastante e trabalhosa, onde os fiéis vão ficando sem força.
A Bíblia fala da integridade e vulnerabilidades do ser humano
Como conclusão, podemos dizer que, se bem não é fácil dizer que tal ou tal outro personagem da Bíblia teve depressão, como a conhecemos hoje, certamente os sentimentos característicos dela são apresentados uma e outra vez em muitas das suas páginas.
Por que? Porque a Bíblia fala também do ser humano. Mas também fala de Deus e como as personagens por nós apresentadas e muitas outras, viveram NA FÉ toda e qualquer expressão de depressão.
Em outras palavras, elas lutaram com Deus, se debateram na oração, se debruçaram nela, para poder encontrar uma saída. Aparece, pois, a oração como a arma da alma que busca a Deus, sem importar a profundeza, nem o abismo de morte em que se encontre.
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