Formação

A Nova Evangelização

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Dom Dominique Rey
Bispo de Toulon, na França

Shalom Maná: Para o senhor, o que é evangelizar, principalmente nestes tempos de guerra?

Dom Dominique: Evangelizar é anunciar Jesus. Jesus é, para nós, a vida de Deus, uma vida de paz, de alegria, de comunhão, de unidade. Então, evangelizar hoje é anunciar a boa nova da paz e sermos artesãos da paz. Nessa situação de guerra em que nos encontramos, eu penso que o papel de um cristão missionário é cultivar em primeiro lugar a paz no seu coração; se ele tem a paz no seu coração, vai transbordá-la em toda a sua vida, em tudo o que o cerca, e também fazer gestos de paz, de reconciliação.

É normal que na vida os homens tenham momentos de tensão, de divisão, de visão diferente das coisas, e o cristão é aquele que tenta caminhos de paz, de justiça e de verdade para guardar a comunhão entre os homens.

A paz é um dom de Deus. E essa paz, que nos vem de Deus, foi entregue nós cristãos para que a desenvolvamos e a façamos conhecida. Primeiro na nossa própria existência e depois em volta de nós. A tentação de muitos homens diante da divisão é de fazer violência, ser agressivo e dominar, mas estas não são atitudes marcadas pelo evangelho. O Senhor nos pede para fazermos a paz, para nos convertermos e convertermos nossa maneira de reagir e de pensar a fim de que a paz possa chegar ao nosso mundo.

Shalom Maná: O que é mais importante para evangelizar os jovens?

Dom Dominique: Para evangelizar os jovens é preciso ser feliz; é a nossa alegria que os atrai. É preciso também mostrar boas perspectivas, mobilizá-los a partir de projetos grandes, porque os jovens têm grandes desejos, grandes sonhos para eles mesmos e para futuro do mundo. Então, é preciso ajudá-los a entrar em projetos entusiasmantes, projetos de generosidade, projetos de construção de um mundo de justiça, de paz e de amor. É assim que se toca os jovens, amando-os em primeiro lugar, depois pela nossa alegria, e finalmente acompanhando-os em boas aventuras espirituais e humanas.

Shalom Maná: Como é trabalhado o ecumenismo na sua diocese?

Dom Dominique: Em primeiro lugar, o Deus de Jesus Cristo, o Deus em quem nós acreditamos é um Deus de diálogo, de comunhão. O Pai, o Filho e o Espirito Santo estão em diálogo permanente, perpétuo. E na história da humanidade, nunca deixou de entrar em contato, de dialogar com os homens.

Fundamentalmente a dimensão do diálogo faz parte da vida cristã, por isso, na nossa diocese procuramos desenvolver este diálogo em duas direções: com os irmãos cristãos não católicos e também com aqueles que não partilham das nossas convicções.

Fiz no início uma grande peregrinação ao deserto e convidei cem pessoas que são de diferentes denominações cristãs a virem rezar pela unidade.

Por outro lado, o diálogo interreligioso se faz também muito presente na nossa diocese porque 10% da população é muçulmana. Podemos dialogar falando com as pessoas, podemos dialogar através da ação, trabalhando juntos para que se tenha mais justiça, mais dignidade. Podemos dialogar também tentando nos encontrar, nos conhecer, partilhando a nossa fé cristã e conhecendo quais são as convicções muçulmanas.

E para nós o diálogo tem sempre que se fazer a partir de Cristo, porque o diálogo não é “eu penso isso, e tu pensas aquilo”, mas, a partir do Cristo, vou tentando descobrir as sementes da verdade evangélica que o outro vive. O diálogo não é um fim em si mesmo, ele existe em vista de um anúncio e de uma proposta de fé cristã.

Shalom Maná: O que caracteriza, quais são os pontos principais da nova evangelização?

Dom Dominique: A característica da nova evangelização não é que ela seja uma segunda evangelização, mas é a mesma evangelização que Cristo começou e confiou à sua Igreja. Mas hoje ela é nova no sentido que se situa em um outro contexto, diferente daquele em que ela começou. É um contexto de secularização, de globalização; contexto em que as capacidades econômicas e técnicas são consideráveis e somos tentados pelo perigo das seitas, do pluralismo, do individualismo… Então, a evangelização é nova no sentido de um novo contexto.

É nova também porque se situa depois de Vaticano II, no espírito de Vaticano II, que insistia muito sobre o chamado comum à santidade. A nova evangelização tem de despertar no espírito dos cristãos o desejo da santidade.

A nova evangelização quer também permitir a constituição de comunidades vivas. Muitas comunidades cristãs estão como que mortas, cheias de poeira, e a nova evangelização vem para renovar a vida das comunidades, renovar o testemunho comunitário. Isso porque a evangelização não é simplesmente o fruto de uma pessoa, é fruto de uma comunidade, é o testemunho de uma comunidade.

E também a nova evangelização deve hoje dotar a Igreja de novos métodos artísticos e culturais, para poder ir ao encontro de populações que estão muito afastados de Deus.

Shalom Maná: Qual a importância do leigo na nova evangelização?

Dom Dominique: Os leigos têm um papel muito importante, pois expressam mais profundamente a dimensão da Encarnação de Jesus. A genialidade do cristianismo é a Encarnação, é mostrar que Deus se apropriou da nossa existência humana e que podemos nos encontrar com Ele na nossa história. Deus não é estranho àquilo que vivemos, mas, ao contrário, está no coração do que estamos vivendo. E o leigo vive mais particularmente esta dimensão de encarnação, porque ele está unido a Deus vivendo nas realidade humanas, profissionais, familiares. Dessa forma, a nova evangelização tem de ser levada pelo testemunho de vida cristã renovada do leigo. A evangelização passa pela mobilização dos cristãos para testemunharem sua fé no lugar onde se encontram. E os padres estão a serviço dessa missão dos leigos, para ajudá-los a entrar nessa vocação missionária que é a vocação cristã.

Shalom Maná: Qual a importância das novas comunidades para a nova evangelização?

Dom Dominique: As novas comunidades são a linha de frente da nova evangelização. Elas revelam um novo modelo de vida cristã que precisamos para descobrir o que é a Igreja. São lugares onde, de maneira particular, se vive a dimensão da comunhão, a dimensão da radicalidade, do engajamento, a dimensão de complementariedade dos estados de vida (celibatários, casais e sacerdotes participando de uma mesma vocação). As comunidades novas são no interior da Igreja lugares totalmente significativos da plenitude do mistério da Igreja. Em geral, as novas comunidades são expressões fortes e consistentes da beleza e da verdade eclesial. Por isso são um dom. E a Igreja precisa desses modelos, desses exemplos como uma espécie de concentração do mistério eclesial vivido de uma maneira mais intensa dentro dessas comunidades.

Shalom Maná: Uma pessoa que nunca evangelizou, ainda não falou de Jesus, por onde deveria começar?

Dom Dominique: Deve, em primeiro lugar, viver DE Cristo. Quanto mais estamos unidos a Cristo, mais temos o desejo e o gosto de falar dele. A segunda coisa é não ficar só, ir procurar pessoas com quem ir para a missão, para a evangelização, que se constituem comunidades missionárias.

É preciso, em terceiro lugar, se formar, porque a missão não é somente um grito do coração, é também a transmissão de um certo conteúdo da fé. Então, é preciso saber o que a Igreja pensa, saber o que faz bater o coração da Igreja.

Em quarto lugar, ser extremamente audacioso e generoso. Se seguirmos esses concelhos veremos a fecundidade da nossa missão. A missão supõe pessoas livres, disponíveis à ação do Espírito Santo para poder inventar respostas, tomar iniciativas e assim promover a boa nova da salvação.

Shalom Maná: Tem alguma coisa que o senhor gostaria de dizer a mais sobre a nova evangelização?

Dom Dominique: Acredito que a NOVA EVANGELIZAÇÃO seja o principal fruto do Concílio Vaticano II. O Concílio deu novamente à Igreja um novo espírito missionário, tornando mais forte a consciência do que ela é e da sua presença no mundo, uma presença de intercessão, uma presença que significa a missão do Cristo.

A nova evangelização nos é dada para entrar mais plenamente no mistério do que é a Igreja – a comunidade, assembléia em torno de Cristo – para anunciá-lo ao mundo.

Shalom Maná: O que você diria para nós, católicos brasileiros e latino americanos?

Richard: Eu diria: precisamos partilhar nossa fé, nós católicos não estamos acostumados a isso. Cremos na morte e na ressurreição de Jesus mas ele também nos chamou a anunciar a sua morte e ressurreição. Devemos anunciar o Evangelho por completo e o Evangelho é JESUS, MARIA e a IGREJA. Como pastor pentecostal, por 25 anos eu anunciei Jesus mas após muita oração e estudo da Bíblia e ter-me convertido ao catolicismo, eu cheguei à conclusão que anunciar o Evangelho é mais do que proclamar “Jesus salva!”. Jesus é a Cabeça da Igreja, Maria é o Pescoço e nós somos o Corpo de Cristo. Nós não podemos ter a Cabeça sem o Corpo e uma parte está ligada à outra. Eu creio que nós precisamos simplesmente nos firmarmos e SERMOS católicos, alegremente partilhando nossa fé. Para um católico não há nada de novo que ele ainda tenha que acrescentar ou ouvir, ele quer partilhar com as pessoas o quanto ele ama Jesus, Maria e a Igreja.

No Brasil e na América Latina quase todo mundo é batizado. Nossos pais talvez não tenham tido uma fé tão esclarecida mas tiveram fé suficiente para batizarem seus filhos e através deste sacramento nós recebemos como que uma semente. Esta semente precisa ser devidamente cuidada para vir a se transformar numa floresta. E todos, e cada um de nós quando foi batizado recebeu esta semente mas muitas vezes não a cultivou, nunca disse sim conscientemente para que ela crescesse. Mas a principal coisa que precisamos fazer no Brasil é viver nossa fé integralmente, em público e de uma maneira alegre para atrair as pessoas para Jesus, para Maria e para a Igreja. A pregação protestante é tão eficaz porque eles falam, proclamam que Jesus está vivo, que Jesus ama e eles vão até as pessoas sem medo. Em cada missa nós proclamamos que Jesus está vivo, que Jesus ama. Precisamos deixar que essa vida flua através de nós, sem medo. Às vezes tememos que se formos muito alegres nosso comportamento será pouco apropriado, será um anti-testemunho. Mas não! Os cristãos são as pessoas mais felizes do mundo! Nós temos Jesus, nós temos Maria, nós temos a Igreja, os sacramentos, nós temos a beleza das catedrais, da vida eterna, nós temos a Tradição. Nós temos tudo! Então, sejamos alegres, vamos ajudar às pessoas, os pobres, mas façamos isso de forma alegre, repito. É o mais importante que podemos fazer: sermos cristãos alegres!

Shalom Maná: Você acredita que tem um papel no ecumenismo por causa da sua história como pastor pentecostal por tantos anos? Como o ecumenismo deve ser feito?

Richard: Acho que tenho um papel sim nessa questão da unidade do Corpo de Cristo mas sobretudo creio que na questão do ecumenismo precisamos ser honestos. Não pode ser um movimento onde nós nos detemos somente naqueles aspectos da fé em que há concordância, que se resume à pessoa de Jesus e aí só falamos de Jesus. Eu não acredito nessa postura. O que eu acredito que vai nos unir, protestantes, católicos, ortodoxos é sermos capazes de partilhar a nossa fé por inteiro, do fundo do coração. Precisamos aprender a escutar e chegaremos à conclusão que cremos basicamente na mesma coisa.


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