Somos seres relacionais. No mundo estamos sempre em relação e contato. Precisamos das pessoas, pois a partir do movimento de alteridade podemos perceber quem somos e quem o outro é. Trocamos vivências, experiências, potências, afetos… Precisamos da natureza, nela vivemos e retiramos o que é necessário para a nossa sobrevivência, a partir dela exercemos o nosso potencial criativo, criamos e recriamos a todo momento. Precisamos de Deus, Ele sustenta a integridade, a esponsalidade e a vida que temos que foi dada por Ele, “então Javé Deus modelou o homem com a argila do solo, soprou-lhe nas narinas um sopro de vida, e o homem tornou-se um ser vivente” (Gn 2, 7).
Como identificar a dependência afetiva ?
Algumas vezes, essas formas de se relacionar podem apresentar desequilíbrios, que são geradores de dor, sofrimento e angústia para os sujeitos envolvidos, como é o caso da dependência afetiva.
Etimologicamente, a palavra dependência vem do latim dependere e significa “estar preso a, estar pendurado”. A dependência afetiva acontece quando uma pessoa coloca sobre outra a responsabilidade e a centralidade de sua existência, isto é, quando credita a um outro algo que não o pertence: a sua vida.
Assim como cada individuo é único em sua singularidade e personalidade, as relações dependentes também são. Elas vão expressar as necessidades das partes envolvidas em uma teia de conflito, controle, insegurança que se não vistas e/ou cuidadas, vão ganhando proporções desgastantes ou até mesmo patológicas, minando a relação e aqueles que dela fazem parte. Não se pode olhar para uma pessoa dependente de forma superficial, é preciso vê-la como um todo, de forma integral, seus processos, sua história de vida, sua forma de estabelecer relações e assim abrir espaço para compreender os porquês dessa forma disfuncional de se relacionar com outras pessoas. É preciso empatia e cuidado.
A pessoa dependente está longe de si mesma, ela está tão envolvida e imersa na relação que ela vai perdendo suas características e adotando preferências e comportamentos que não são seus, mas do outro, do objeto da sua afeição. Ela vai se desconstruindo e esquecendo de si mesma, em caso mais graves ela chega a não se reconhecer mais no mundo, a não saber quem é, porque tudo se torna o outro, tudo é para o outro.
O outro é o seu salvador, a pessoa que vai suprir todas as suas necessidades de felicidade, amor, afeição. Acompanhada dessa compreensão, é presente também de forma constante o medo de perder a pessoa amada, medo da relação acabar, de ser deixada, o que se torna motivo de ansiedade que desemboca na extrema necessidade de controlar o outro e o aumento significativo dos sentimentos de insegurança.
Como superar ?
O sujeito perde a sua liberdade de ser. Esse modo dependente ou codependente acaba se tornando um padrão na forma da pessoa se relacionar, sendo expandido para outros campos relacionais. Essa forma disfuncional de estar com o outro pode sim ser superada e resinificada com os cuidados necessários, apoio familiar, terapêutico, comunitário, espiritual. O movimento é o encontro consigo mesmo, estar em contato, se reconhecer no mundo como um ser autêntico e singular, com suas potências, habilidades e características, voltar a amar quem ele é e sua história. Isso exige tempo, cuidado, paciência e amor.
O amor nos lança de volta para nós mesmo!
As pessoas não são e nunca podem ser prisões. Não se pode viver refém de uma relação não saudável. O amor, como diz São Paulo em sua primeira carta aos Coríntios: “nada faz de inconveniente, não procura seu próprio interesse, não se irrita, não guarda rancor” (1Cor 13, 5). Uma profunda experiência de Deus é capaz de ordenar tudo, Nele se pode encontrar esse Amor tão procurado e desejado.
É Amor que faz viver, que é sopro de vida nova, de esperança! Não um amor desconfiado, inseguro que nos afasta de nós mesmos. Deus nos lança de volta para nós mesmos, Ele nos ajuda a ver nossas belezas, nos ajuda a ser livres e a desejar amar também livremente. É só o Amor que liberta!
Kyaya Gomes de Carvalho